Com o agravamento da fome e das desigualdades sociais no Brasil, grupos autônomos promovem iniciativas e ações de distribuição de cestas básicas, produtos de higiene e intervenções de conscientização em Teresina. Aliado a isso, outros oferecem assistência psicológica a preços acessíveis para quem não tem condições de arcar com os custos.
O grito pela sobrevivência é lançado na cidade. “Não nos deixe morrer de fome e muito menos de Covid”, gritou Marlene Vitório, 55 anos, durante ato realizado em março deste ano na Avenida Marechal Castelo Branco, em Teresina. A moradora da ocupação Dandara dos Cocais integra o Quilombo Marxista, coletivo criado para estudar Marx e levar suas concepções de mundo para a periferia. Com o contexto da pandemia, o grupo passou a realizar ações com objetivos de combater a fome e a falta de trabalho e reivindicar qualidade de moradia à população que mora na periferia da capital piauiense.
O manifesto em questão é parte de uma conscientização sobre a necessidade de segurança no contexto pandêmico, como também os cuidados com o bem estar da periferia e no auxílio ao cadastro de vacinação: “A gente faz o cadastro para quem não tem internet. O governo acha que todo mundo na comunidade tem acesso”, comenta a moradora Marlene.
O Coletivo Quilombo Marxista nasceu de um grupo de estudos que logo se tornou também um grupo de intervenção, após a necessidade de sair das discussões e começar a exercitar as ideias de mundos que eles desejam, que envolve colaborar com a auto articulação das comunidades, para que os moradores das áreas sejam atores das suas demandas, acelerando discussões e como agir diante das suas necessidades. “A gente quer trazer para a periferia, principalmente pros jovens, um caminho a seguir diante da ausência do Estado”, diz Marlene.
Majoritariamente, o grupo é composto por ativistas independentes e moradores de duas ocupações na cidade de Teresina, o Dandara dos Cocais, na zona Norte, e a Angico, na zona Sul da capital. Ambas com histórico de luta por direito à moradia. Hoje, entre as principais discussões do coletivo, estão a segurança sanitária da zona periférica, a fome, e o direito e segurança no trabalho.
O chamado “Fogareiro Comunitário”, é um projeto que distribui refeições e cestas básicas para os moradores. Os alimentos são adquiridos em doações na Ceasa, supermercados e com amigos e parentes . “A pandemia traz as suas exigências: a fome se impõe e gente não pode ficar omisso à isso e juntamente com as comunidades a gente foi se organizando para esses problemas que são consequências da pandemia”, diz Diego Parente, 32, professor da rede estadual de ensino, responsável por gerenciar a comunicação do grupo. O Quilombo também articula doações de máscaras, produtos de limpeza e higiene.
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O professor Diego Parente, integrante do projeto, diz que a escolha do nome do coletivo não é à toa. “Quilombo” faz referência aos locais de mesmo nome que foram refúgio e espaço de articulação de negros escravizados no período da escravidão no Brasil. E marxista, por seu modo de ver o mundo, a partir da luta de classes: “A luta que a gente faz é na periferia, e a periferia tem cor: é preta. E segue esta lógica brasileira de exploração do povo preto. O Quilombo nasce dessas ideias e pensando nessas questões”, comenta.
O grupo prevê intervenções culturais futuras, como aulas de balé e música, como também educativo, como alfabetização e pré-vestibular, mas devido a pandemia, o planejamento ainda não foi definido.
Grupo realiza ações de doação de cestas básicas e produtos de higiene
Foi durante o ensino médio, que as primeiras ideias surgiram na mente de Isabela Uchôa, 22 anos: criar um grupo que cativasse pessoas, e com seus atos, tornassem o mundo um lugar melhor. Com esse objetivo, a acadêmica de enfermagem fundou o projeto RevigorAmar, nome pensado totalmente baseado no que desejava causar nas pessoas: revigorar o amor e a solidariedade.
Com ações mensais, Isabela conta que mesmo durante os meses iniciais da pandemia, as ações não foram paralisadas, mas tiveram que ser reinventadas, para não expor voluntários e as pessoas beneficiadas pelas ações. As doações se intensificam em datas comemorativas como Páscoa e Natal. Não há um público específico: pessoas em situação de rua, ações em orfanato e hospitais, asilos e comunidades, e as ações surgem de acordo com a necessidade de cada ocasião, e podem ser entrega de lanches, produtos de higiene ou cesta básica.
Com intervenções culturais, solidárias e educativas, Isadora diz que o projeto não só se encarrega de fazer apenas doações materiais, se encarregando das dimensões não visíveis, mas também necessárias: uma conversa, troca de ideias, uma palavra de conforto, interações e até musicoterapia. “Por mais que o alimento supra a necessidade física, o alimento da alma também é valioso. Às vezes a gente se depara com alguém que só quer conversar, só quer receber um sorriso”, comenta.
O projeto conta com mais de 100 voluntários, em sua maioria jovens, onde cada pessoa do grupo pode ficar a vontade para guiar algum tipo de atividade, ajudando direta ou indiretamente; doando, planejando e divulgando as ações para cumprir a missão de cada mês e cuidando das redes sociais. Com a visibilidade do projeto e a confiança no trabalho, recebem doações mensalmente, mas não há fonte fixa de financiamento. As metas são atingidas a partir de quem acredita no potencial do coletivo.
Assistência psicológica para quem precisa
Beto é o apelido do Betenhaussen Silva, 29 anos. Ele integra o grupo Psicólogos de Plantão que com atendimentos psicológicos online gratuitos ou com valores reduzidos, se dedicam a colaborar com o bem estar emocional e psicológico a quem precisa.
Tudo começou com a necessidade em discutir algo específico dentro da saúde mental: o suicídio. Foi com a observação de psicólogos da área clínica, que trabalham em consultório e sua alta demanda por solicitações de atendimento com pacientes com ideação ou potencial suicida, que surgiu a preocupação que o assunto traz.
O projeto, que teve seu início na capital piauiense, hoje tem contato com pessoas de todo o Brasil e no exterior, contando com uma equipe de atendimento de mais de 50 psicólogos de todos os estados. O projeto ultrapassa em sua totalidade mais de 3500 atendimentos, de acordo com uma estimativa feita pelo grupo. Em razão da pandemia, Beto diz que a equipe chegou a ser composta por 80 profissionais, devido a demanda de pacientes, com questões sobre ansiedade em pontos mais intensos da pandemia.
“É o benefício do bem estar mental para pessoas que muitas vezes não possuem condição, mas precisam do atendimento”. O projeto viabiliza terapia social por um valor acessível para quem não tem condições de arcar com os custos das consultas. As sessões disponíveis são divulgadas pela rede social no perfil do projeto. Além disso, também conta um plantão de atendimento gratuito, mas de caráter emergencial, que podem ser solicitados até duas vezes. “De uma certa forma, o projeto coloca que a psicologia deve ser para todos os públicos. Ela não pode ser fechada a um determinado grupo. A saúde mental é importante e todos precisam”, diz o psicólogo Beto.
Há espaço para quem desejar colaborar. O projeto acredita que toda ajuda é bem vinda e profissionais que desejam fazer voluntariado na ação, podem fazer contato com o grupo.
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