O Congresso Federal deverá votar nos próximos dias um projeto de lei complementar de alterações na legislação eleitoral, incluindo a censura às pesquisas de intenção de voto. Esta é a intenção do presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), que confirmou a pretensão em colocar o projeto em votação.
O texto protocolado na segunda-feira (2), ainda vai passar pelo crivo de deputados e por discussões. A votação chegou a ser prevista para a última quarta-feira (4), mas não aconteceu e uma nova data ainda não foi confirmada.
O projeto é relatado pela deputada federal piauiense Margarete Coelho (PP-PI) e pretende revogar toda a legislação eleitoral, além de estabelecer um único código eleitoral que poderá entrar em vigor já nas eleições de 2022. Mas antes, a medida precisa ser aprovada por Câmara e Senado e ser sancionada pelo presidente da República até o início de outubro, um ano antes da disputa.
O projeto tem sido tema de debates e críticas dos especialistas por conta das muitas medidas que representam um verdadeiro retrocesso. Em um dos artigos, proíbe a divulgação de pesquisas de intenção de voto na véspera e no dia das eleições, o que é visto como uma censura: sendo aprovada, a medida sonega ao eleitor a possibilidade de ajustar o seu voto em uma reta final. O texto também determina que os institutos informem um percentual de acertos das pesquisas realizadas nas últimas cinco eleições.
A proposta também enfraquece as cotas para estímulo de participação de mulheres e negros na política, esvazia regras de fiscalização e punição a candidatos e partidos que façam mau uso das verbas públicas, além de tentar colocar amarras ao poder da Justiça de editar resoluções para as eleições.
Além disso, o projeto torna muito mais difícil a cassação do mandato de parlamentares por irregularidades na campanha, como a compra de votos — para que haja essa possibilidade, terá que ser provado que o candidato usou de algum meio violento para coagir o eleitor.
O projeto também dificulta a criação de novos partidos ao aumentar a quantidade mínima de assinaturas necessárias. Passa de 0,5% para 1,5% do número de votos válidos para deputado. De acordo com as regras atuais, para criar um partido é necessário conseguir assinaturas de apoio de 491,9 mil eleitores não filiados a outras siglas em um prazo de 2 anos.
Se aprovado, o projeto também amplia as possibilidades de utilização do fundo eleitoral, dificultando a sua fiscalização. A proposta prevê que as legendas poderão realizar qualquer tipo de gasto — de propagandas políticas à compra de aviões e imóveis e ainda poderão contratar empresas de auditoria para ajustar as contas antes de submetê-las à apreciação da Justiça Eleitoral.
O novo código também pretende suavizar a lei da ficha limpa, descriminalizando práticas atualmente proibidas como a boca de urna, o transporte de eleitores e os comícios realizados no dia da eleição. Assim, crimes eleitorais que poderiam levar à cadeia, passam a ser punidos apenas com multas. A medida já conta com apoio considerável no Congresso.
Se aprovado, país viverá um retrocesso
O professor especialista em Direito Eleitoral, Carlos Douglas destaca que o projeto apresenta propostas que, em sua maioria, só trazem efeitos negativos. “Infelizmente, no Brasil, os parlamentares deixam para provocar essas mudanças em cima da hora, justamente para que não haja tempo de uma análise ou discussão mais calorosa sobre o tema”, explica.
Com relação a possível censura à divulgação das pesquisas às vésperas das eleições, o especialista adianta que a medida provavelmente não funcionará, ainda que aprovada. “A pesquisa, antes de ser divulgada, precisa ser registrada com cinco dias de antecedência no sistema do TRE, então aqueles que quiserem divulgar na véspera da eleição vão fazer isso”, citou.
Para ele, a possibilidade da aprovação do projeto pode provocar um verdadeiro retrocesso. “Eles querem tirar da Justiça a competência da análise das prestações de contas eleitorais, mas os Tribunais de Contas não admitem isso. As mudanças em relação ao Fundo Partidário vão permitir a volta do financiamento privado, que está restrito por ter sido tema de operações como a Lava Jato, além de outras questões que tendem a diminuir a transparência do processo eleitoral, reforçando ainda mais a ideia de retrocesso”, conclui.
Procurada, a deputada federal Margarete Coelho (PP), relatora do projeto, informou que não iria se pronunciar sobre o assunto.
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