Se antes o Instagram era considerado uma plataforma para celebridades divulgarem seu dia a dia, a rede social tem se tornado quase um palanque digital para qualquer serviço, pessoa ou ideia. Desde 2012, quando foi comprada pelo Facebook, a plataforma deixou de ser uma rede social focada em conteúdo visual para dar espaço a textos e botões de compartilhamento – o que fomentou sua base de usuários captar também os perfis do Facebook.
Somente no Brasil, há cerca de 72 milhões de contas ativas. Uma das explicações para o crescimento expansivo da rede é que os usuários estavam cansados da interface desordenada do Facebook e das dificuldades em controlar a privacidade. “Com o passar das gerações, os filhos tendem a correr das redes sociais dos pais”, explicou Maíra Medeiros, diretora criativa de mídias sociais de uma agência no Piauí. “Vai tendo uma migração natural pelo novo e o que está em alta”.
De lá para cá, não apenas o Instagram, mas a forma das pessoas se comunicarem também mudou. Essas transformações estão sendo sentidas na arena política. Segundo o relatório do Comitê de Inteligência do Senado Americano, em 2016 e 2017, a maior parte dos políticos em campanha eleitoral no país engajaram seus esforços propagandistas no Instagram – deixando de lado redes como o Twitter e o Facebook.
No Piauí, a performance nas redes sociais não passou despercebida. Isso porque, estar fora das plataformas de interação já não é mais uma opção para quem deseja estar na vida pública. Quem percebeu, ainda em 2021, foi o agora pré-candidato a governador do Piauí pelo Partido dos Trabalhadores (PT), Rafael Fonteles. Até 2020, ele sequer tinha perfil no site e suas ações eram registradas nos bastidores da assessoria de comunicação da Secretaria de Finanças – com um tom impessoal e institucional.
Em agosto do ano passado, Fonteles comemorou 10 mil seguidores no perfil. À época, ainda secretário, ele agradeceu as interações e comemorou a troca oferecida pelo canal de informação. Hoje, o ex-secretário acumula quase 30 mil seguidores.
O semblante sisudo e com pouco jeito para dancinhas não impediram Rafael de se lançar na plataforma antes de oficializar seu nome ao pleito. O “menino do Lula”, como também gosta de ser chamado nas redes, faz de tudo: come cuscuz, toca triângulo, dança piseiro, abraça crianças, toma café com idosos e está sempre ligado nos hits do momento. Já era quase que tradicional os servidores se informarem sobre o recebimento do salário pelo perfil de Fonteles. O ex-secretário celebrava os repasses antes do prazo com um vídeo animado. Em um deles, ao som de Tarcísio do Acordeon, ele aparecia dançando. “Sextou com antecipação”, destacava a legenda no vídeo. Sobrou até para o ex-governador Wellington Dias, que aparece em uma passagem do vídeo tocando trompete.
Nem só de dancinhas tik tok vive Fonteles. Para além do terno e das viagens feitas pelo PRO Piauí – programa de investimentos e obras do estado coordenado por ele -, o pré-candidato ao governo abriu as portas da sua casa. Os filhos e a esposa também são figuras esporádicas que aparecem na timeline dos seus seguidores nos momentos de lazer do ex-secretário. Se antes pouco se sabia sobre a vida pessoal de Fonteles, atualmente, os nomes de Thomaz, Elisa e Teresa e a esposa Isabel estreiam na biografia de seu perfil, ao lado de um mini currículo do pré-candidato – ou melhor, do usuário.
Em contrapartida, seu pré-candidato a vice-governador parece não estar tão atento aos holofotes digitais quanto o companheiro de chapa. Diferente de Rafael, mas igualmente com pouca desenvoltura musical, Themístocles se restringe às agendas políticas. Em seus destaques, uma síntese do conteúdo da sua rede acompanhada por 19 mil seguidores: visitas, solenidades, sessões, amigos e MDB – Movimento Democrático Brasileiro, sigla partidária ao qual é filiado desde 1982.
Até agora, Themístocles ainda não se rendeu às dancinhas e interações mais íntimas – e ao que parece, para os que conhecem sua personalidade, não deverá ser assim tão fácil. Fonteles, que em poucos meses já teve o perfil verificado (selo de autenticidade da conta), terá muito o que ensinar para o aliado.
Outro que também ainda parece resistente às redes sociais é Silvio Mendes, também pré-candidato ao governo do Piauí. O ex-prefeito de Teresina acumula pouco mais de 17 mil seguidores e possui bem menos que a metade de publicações no feed de Rafael. Se a eleição fosse contada por seguidores, Fonteles venceria por quase o dobro de votos. Mendes tem seguido passos da política tradicional: andanças e agendas com aliados pelo interior do estado e na capital. Ele, que por muito tempo evitou falar com a mídia, desponta esporadicamente em telejornais do meio-dia para criticar a atual gestão da prefeitura de Dr. Pessoa.
Até maio do ano passado, Sílvio não publicava nada na sua conta do Instagram. Hoje, não há um dia sequer que o político não compartilhe uma reunião ou declaração na mídia. Uma publicação anunciando sua disposição ao cenário político deu fim ao jejum digital. No post, ele diz: “Não é momento de lançarmos qualquer pretensão política. Mas é momento de estarmos a postos e atentos para que Teresina possa continuar equilibrada”. A interação com os seguidores foi imediata e logo um perfil cobrou: “Apareça mais, Sílvio”. Mendes seguiu o conselho, e de lá para cá, passou a publicar religiosamente – segue com até quatro postagens por dia.
Na guerra dos algoritmos, a vencedora é Iracema Portella – pré-candidata a vice-governadora do Piauí, com maior quantitativo de seguidores – cerca de 60 mil. A deputada, antes de colocar seu nome à disposição do governo, sempre fazia questão de comemorar com uma publicação cada vez que conquistava novos 10 mil seguidores. Ela utiliza tudo o que a ferramenta oferece: reels, stories, vídeos, destaques atualizados, participa de hits, correntes e sabe utilizar as tags que impulsionam as postagens – cria até hashtags próprias, como a #iracemaresolve.
Nas colunas sociais dos dois jornais impressos ainda em circulação do Piauí, Iracema é figurinha carimbada. Ela nunca passa mais de um mês sem abrilhantar as páginas com os cabelos sempre escovados, maquiagem retocada e sorriso alinhado para as câmaras. Mas Iracema já sabe que não é por lá que a máquina de impulsionamentos funciona, então potencializa atenção para as redes. O que não deixa de acontecer é um “bate e volta” entre a internet e o papel: se publica nas redes um conteúdo, no outro dia é certeza de uma notinha nas colunas sociais.
Intencionalmente ou não, Iracema criou um padrão de moda na sua rede. Quando está em caminhada com apoiadores e a população, sua roupa também é comunicação. Blusas baby looks estampam frases de apoio ao Piauí. As vestimentas mudam de cor e mensagens: “Piauí: nosso sonho, nosso amor”, “O Piauí é daqui para frente”, “Piaui das Marias” e “O Piauí merece ser grande”, entre outras.
Enquanto os pré-candidatos correm para atualizar suas redes, Robert Rios, vice-prefeito de Teresina, que mais recentemente pediu exoneração da Secretaria de Finanças para concorrer ao governo, parece não se preocupar com suas redes sociais. No Instagram, com 8.008 seguidores, sua última publicação é ainda do ano passado, do dia 16 de dezembro – sorrindo, sentado em uma grande poltrona vermelha, de pernas cruzadas e com a boca escancarando uma gargalhada ao lado do prefeito Dr. Pessoa. Não há nenhum vestígio digital no perfil de Rios que mencione sua pré-candidatura. Um fato curioso é que Robert é mais assíduo no Facebook – a rede que os especialistas afirmam ter os dias contados, com atualizações de fotos e lembranças. Rios parece ser dos que fazem campanha à moda antiga.
Outros corredores no páreo são Gessy Fonseca e Wallace Miranda. Os dois perfis são jovens, tanto em idade como em caminhada política, se comparado aos adversários. Ambos alegam estar no cenário para furar a bolha da “velha política”. Para confrontar os figurões, estão utilizando as redes sociais para fermentar discussões e chamar público com lives, stories, caixinhas de perguntas e posts agressivos – no bom sentido marqueteiro, claro. A estratégia já é bem conhecida por Gessy que, durante a campanha para prefeitura de Teresina, surpreendeu em 3° lugar na eleição contra Dr. Pessoa e Kléber Montezuma. Cientistas políticos ouvidos pelo oestadodopiaui.com apontaram que a movimentação nas redes, somada às publicações e sua desenvoltura nos debates televisionados, foi o que causou uma movimentação essencial nas eleições municipais de 2020, fazendo Gessy alcançar um feito louvável: transformar seguidor em eleitor. Nas redes sociais, Gessy contabiliza 55 mil seguidores e, na eleição, obteve 50.221 votos.
Miranda, por outro lado, é o candidato do Partido Novo que já chegou a presidir a legenda no Piauí. Com menos de dois mil seguidores, se declarou o candidato “ficha limpa” e ainda mergulha no “antipetismo”. A cada 10 postagens, não deixa passar críticas ao ex-presidente Lula, Wellington Dias e ao partido dos trabalhadores. Uma olhada superficial na conta de Miranda, pode confundir o político com um simples apoiador, devido a série de imagens de Wellington, Rafael e Lula. Disruptivo, ele critica a todos: tucanos, emedebista, da Alepi à Câmara dos Vereadores, passando pelo Palácio da Cidade e chegando ao Karnak. Propostas quase não há – mas críticas, não faltam.
Por trás dos celulares
Os políticos ou personalidades, obviamente, não são sempre os responsáveis pela atualização de suas redes. Do outro lado das câmeras, profissionais de comunicação e mais especificamente, o social media, fazem a máquina nunca parar de funcionar. De 2012 para cá, a profissão de gerenciador de mídias digitais tem ganhado destaque e também rendido novos modelos de negócios.
Comumente, uma equipe ideal para alimentar uma rede social é formada por fotógrafo, videomaker, designer e um redator – geralmente um jornalista ou publicitário – mas, com a popularização de aplicativos e plataforma de design gráfico, como Canva ou Crello, essas atividades chegam a ser reduzidas a uma só pessoa: o social media.
Desde 2012, essa profissão tem ascendido junto com o cenário digital. O salário de um gerenciador de mídias digitais pode chegar a 5 mil reais mas, a grande maioria, trabalha em agências ganhando comissões entre R$300 a R$600 reais por clientes. O que também abriu portas para o crescimento desse mercado é que, diferente de outras áreas da comunicação, você não precisa ter diploma ou qualquer curso técnico para exercer a função.
A grande parte do lucro fica, é claro, com as agências de mídias de grande porte – em período eleitoral, elas chegam a fechar contratos milionários. Por outro lado, uma boa parte dos profissionais segue fazendo trabalhos independentes e gerenciando empresas e pessoas pelas mídias sociais. Um social media entrevistado pela reportagem, que preferiu não se identificar, destacou que as agências de mídias se tornaram o novo chão de fábrica. “É um trabalho ainda muito explorado de forma negativa”, revelou. “Quem está no dia a dia de uma redação para mídias chega a trabalhar final de semana e até mais de 12h”, contou. Por trás de um político on, há sempre um social media cansado.
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