Em matéria recente, a Folha de São Paulo divulgou que cerca de 26 mil pessoas receberam doses vencidas da AstraZeneca em diversos postos de saúde do país.
A informação, divulgada na sexta-feira, 2 de julho, foi propagada instantaneamente por todo o país, em veículos nacionais e locais. Na sequência, muitos municípios negaram ter aplicado vacinas vencidas – as prefeituras alegaram que houve falha no sistema de dados do Ministério da Saúde.
Após quatro dias, o veículo divulgou uma matéria admitindo que “errou ao não afirmar que dados sobre vacinas vencidas poderiam decorrer de falhas do sistema”. A matéria explicava de forma mais detalhada como se deu a apuração jornalística.
A repercussão do caso gerou alerta na sociedade. O receio de ter recebido imunizantes vencidos corroborou com o discurso de desconfiança da proteção das vacinas contra a Covid-19, além de certa descredibilização da imprensa. Para Pollyana Ferrari, pós-doutora em comunicação, professora da PUC-SP e pesquisadora em mídias digitais, casos assim requerem cuidados redobrados – e envolvem, sobretudo, nossa capacidade de interpretação dos dados. “A gente precisa ter paciência, ter calma, ter um olhar crítico”, frisa. “Pensar no que vai compartilhar e o quanto isso pode espalhar de terror no meio de uma pandemia”, pondera. “Erros acontecem, mas a gente precisa ter esse cuidado”, acrescenta.
No contexto de uma crise sanitária global, o excesso de notícias também é sintomático e está associado a um fenômeno conhecido como infodemia, nome dado ao aumento significativo no volume de informações, corretas ou não, com o qual somos bombardeados diariamente. A própria Organização Mundial de Saúde (OMS) cunhou o neologismo, dando conta de uma epidemia de informações.
No ano passado, representantes da Organização Pan-Americana da Saúde (OPAS) e da Organização Mundial da Saúde (OMS) no Brasil, apontaram que a infodemia tem dificultado respostas à pandemia da Covid-19, especialmente em razão da circulação de notícias falsas, conhecidas popularmente como fake news.
O relatório da OPAS que trata sobre a infodemia e a desinformação em tempos de pandemia, aponta que a infodemia acelera e perpetua a desinformação, ao tempo em que reforça que “é fundamental interromper o ciclo da desinformação que, por sua vez, se expande no mesmo ritmo que a produção de conteúdo e as vias de distribuição se multiplicam”.
A pesquisadora e jornalista Ana Regina Rêgo, criadora e coordenadora da Rede Nacional de Combate à Desinformação (RNCD), chama atenção para o papel do jornalista nessas situações. “Nós, jornalistas, temos que refletir muito acerca da nossa responsabilidade nesse momento ao apurar e repassar alguma informação dentro de uma matéria jornalística, considerando que estamos lutando contra um grande mercado da desinformação”, reforça a doutora em processos comunicacionais. E acrescenta: “Não podemos nos dar ao luxo de simplesmente divulgar qualquer coisa, apontando o dedo, sob a pena de vir a causar pânico, como o que aconteceu”.
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