Os conflitos fundiários resultantes da má distribuição e da concentração histórica de terras marcam a história do Brasil. E o Piauí também está inserido nesse contexto. Para alguns estudiosos, este fator gera um grande obstáculo ao pleno exercício dos direitos sociais de um povo e também ao desenvolvimento econômico do estado. Catalogar e registrar a história da terra é um passo importante na busca por uma solução aos impasses históricos.
No Piauí, um projeto está sendo desenvolvido a fim de oferecer, nas plataformas digitais, toda a história da terra do estado. Mapas de cidades e ruas, registros de propriedades e gráficos desenhados a partir do século XVII e imagens das Sesmarias dos anos de 1697 a 1823 – todos esses registros irão fazer parte do novo acervo digital que será disponibilizado para consulta através de uma biblioteca virtual. O projeto desenvolvido em parceria entre o Instituto de Terras do Piauí (Interpi) e a Fadex (Instituição de fomento à pesquisa da Universidade Federal do Piauí), com o apoio financeiro do Banco Mundial, será lançado na próxima sexta-feira, dia 5 de novembro, durante o seminário Propriedade territorial no Estado do Piauí.
No Brasil, há diversas iniciativas para disponibilizar acervos históricos de bibliotecas e arquivos públicos. O diferencial do projeto no Piauí está no fato de reunir eletronicamente o acervo de cadastros e registros de épocas distintas de um único estado – o Piauí é o único estado a disponibilizar na internet as imagens originais dos arquivos de registros paroquiais de terras e dos registros estaduais de terras realizados no século XIX.
Flávio Martins, um dos idealizadores do projeto, relata que o Piauí precisava organizar o máximo de informações sobre seu território para conhecer suas terras devolutas. Para isso, foi necessário realizar um trabalho de pesquisa catalográfica de todas as informações reunidas sobre o histórico da gestão territorial piauiense desde o período colonial. “A Biblioteca Virtual surgiu como consequência da necessidade de apresentar de forma fácil, rápida e segura para toda a sociedade piauiense os ricos e raros acervos de atos de gestão territorial do Piauí”, comentou.
De acordo com Flávio, a importância desse trabalho também está na abrangência e democratização do acesso: agora, qualquer cidadão poderá consultar as fontes primárias que deram origem a cada parte do território piauiense.
Importância acadêmica e socioeconômica
Para o estudioso em terras, registros eclesiais, regulamentação fundiária e conflitos, Cássio Borges, entender sobre a configuração atual do território piauiense passa por um exercício de pesquisa sobre a formação dos empreendimentos rurais que se estabeleceram por aqui. Do período colonial ao tempo presente, essas configurações tiveram como ponto de partida a conquista da terra – e, para entender como isso ocorreu, foi necessário ir atrás de fontes de pesquisas institucionais sobre esse processo.
“Esse projeto possibilitará a pesquisadores futuros narrar sobre o universo rural do Piauí”, destaca Borges. “Desde o processo conturbado de desterritorialização (para não dizer massacre) dos agrupamentos indígenas, estabelecimento das fazendas e sítios agropastoris à formação dos atuais municípios e comunidades rurais”.
Outro ponto importante para o pesquisador é o desenvolvimento socioeconômico que o projeto irá trazer para o Piauí, uma vez que trará segurança jurídica especialmente quanto à titularidade de bens imóveis – pré-requisito para a realização de investimentos de longa duração. O trabalho também pode garantir segurança jurídica para proprietários de terras no estado com áreas de conflito em razão da ausência de documentos comprobatórios.
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