Com sabor de morango, abacaxi, uva, menta e outros, o cigarro eletrônico vem substituindo gradativamente o uso do cigarro convencional – o branco, comprado em carteiras ou unidades em estabelecimentos comerciais. Desde 2018, de acordo com o Instituto Nacional de Câncer, o consumo aparente e prevalência do uso do cigarro comum apresentou queda crescente na última década. Entretanto, por conta do aroma, sabor e formato diferenciados, os dispositivos eletrônicos com nicotina fazem parte do uso diário ou ocasional de cerca de 3% da população com mais de 18 anos, segundo pesquisa realizada pela ACT Promoção da Saúde.
Para Júnior Alves, de 28 anos, o uso do cigarro eletrônico – e-cigarette ou tabaco aquecido – é uma febre entre os jovens por “modismo”. Ele acredita que parte das pessoas usa para se enturmar e postar vídeos nas redes sociais. A outra parte, para Júnior, usa para substituir o vício em nicotina. Ele, apesar de fazer uso, não se vê em nenhum dos grupos. “Uso só em festas, como uma bebida que tenho pouco costume e faço uso de forma ‘social’”, afirma o jovem.
Basta entrar em um restaurante – com espaço ao ar livre ou fechado – que Maria Araújo, de 20 anos, encontra diversos amigos fazendo uso dos vaporizadores. O cigarro, por não ter uma fumaça e cheiro que incomodam os olhos e o ambiente, acabou sendo mais atrativo para quem frequenta esses espaços. Segundo a estudante, essa é a razão para muitas pessoas usarem indiscriminadamente em qualquer lugar, seja ele ventilado ou não.
No entanto, no dia 30 de novembro, o prefeito de Teresina, Dr. Pessoa sancionou um Projeto de Lei (PL) que proíbe o uso de cigarros eletrônicos e narguilés em espaços fechados e ambientes de uso coletivos, públicos ou privados. Antes, a proibição se restringia a cigarros, cigarrilhas, charutos e cachimbos – ou de qualquer produto fumígeno derivado ou não do tabaco.
Agora, com a lei, os cigarros eletrônicos são considerados como prejudiciais à saúde em Teresina. Entre as motivações, relatadas pelo vereador Dudu Borges – autor do PL – o assunto tornou-se uma pauta de saúde pública, uma vez que muitas pessoas estavam fazendo uso deliberado em espaços de trânsito comum.
Além disso, não é difícil encontrar vários jovens compartilhando do mesmo dispositivo em encontros ou festas. “Ficam entre cinco a sete jovens usando do mesmo cigarro”, ressalta Maria, ao pontuar que além das aglomerações nas festas sem uso de máscara, o cigarro provoca outro tipo de contato que facilita a transmissão da Covid-19.
A estudante não lembra ao certo quando começou a fumar, mas recorda que se sentiu atraída e motivada quando ia para esses encontros. Apesar de saber dos riscos para a saúde, a jovem não descarta eliminar o cigarro em uma eventual festa. “Eu uso quando sinto vontade”, comenta. “Não é um hábito que levo para casa. Posso parar quando quiser”, frisa a jovem.
Uma troca perigosa
A febre dos dispositivos em Teresina foi o que fez Sammya Costa apostar em vendas onlines dos cigarros eletrônicos. Ela afirma que 90% dos compradores são jovens, de classe média e classe média alta. Com valores que chegam de 40 a 600 reais – o maior registro de venda são dos descartáveis, cujo preço médio alcança até 100 reais.
O “cardápio” é variado e possui boa saída. Apesar de no Brasil a venda e propaganda de dispositivos destinados ao fumo serem proibidos pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) desde 2009, não apenas Sammya, mas diversos outros vendedores utilizam as redes sociais para fazer a divulgação e comercializar – estratégia que ficou conhecida como “delivery de cigarros”.
O feedback que recebe dos clientes paira sobre substituir o cigarro eletrônico pelo cigarro convencional. No entanto, ela alerta que o teor de nicotina é muito maior. Em dispositivos descartáveis, que possuem cerca de 5% de nicotina, o uso equivale a de uma carteira inteira de cigarros brancos. “Ao passo que substituem, muitos se viciam”, destaca Sammya.
No estudo “Os riscos do uso do cigarro eletrônico entre jovens” foi observado que, embora nem todos os dispositivos tenham os mesmos componentes do cigarro tradicional, o objeto é capaz de levar a uma dependência psicológica e comportamental. De acordo com os pesquisadores, da adolescência até os 30 anos, considera-se que os indivíduos estejam mais inclinados a experimentar os cigarros eletrônicos – o que se acentua ainda mais caso o dispositivo se torne um “modismo” uma vez que o apelo da identificação e do necessidade de pertencer a um grupo falam mais alto aos indivíduos dessa faixa etária.
Desde os anos 50, instituições de saúde buscam formas de diminuir o uso de nicotina através do fumo por campanhas de conscientização com resultados positivos. Entretanto, a pesquisa reforça que o uso e publicização do cigarro eletrônico coloca esses esforços em declínio – principalmente pela ilusão de que o uso do dispositivo é capaz de substituir o cigarro convencional como uma estratégia positiva.
Para Sammya, mesmo com a lei em Teresina, a vendedora acredita que as vendas não irão cair. “O cigarro eletrônico veio para ficar”, afirma a vendedora. “Ele é moderno, mais caro, claro, mas já caiu no gosto do povo”, pontua. Ela acredita que, mesmo com a lei, não haverá fiscalização eficiente para conter usuários em locais fechados.
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