sexta-feira, 22 de novembro de 2024

Polícia que mata

Relatório aponta um evento violento a cada três horas no Piauí e Maranhão - ações policiais estão em metade dos casos

24 de março de 2022

Aí, nessa equação chata, polícia mata, plow! Médico salva? Não! Por que? Cor de ladrão, desacato invenção, maldosa intenção, cabulosa inversão, jornal distorção”. O trecho da música do rapper Emicida retrata um tema que vem sendo cada vez mais analisado por pesquisadores em segurança pública no Piauí: a violência policial. 

A Rede de Observatórios, que tem como objetivo monitorar e difundir informações sobre segurança pública, violência e direitos humanos, começou a operar no Maranhão e Piauí em agosto de 2021 e acaba de divulgar os resultados dos primeiros seis meses de monitoramento nos dois estados.

O boletim reúne as informações coletadas pelos pesquisadores em análise diária das informações produzidas por jornais, sites de notícias, grupos de WhatsApp, contas do Twitter e a sistematização dessas informações em um banco de dados. 

Foram monitorados 2.060 eventos violentos nos dois estados, durante os últimos seis meses – isso equivale a 11 registros diários, ou um a cada três horas. Ações policiais violentas representam quase metade desse número (59%). Juntos, Maranhão e Piauí somam 1.210 eventos deste tipo, com 34 mortes (29 no Maranhão e 5 no Piauí) e 14 feridos nestas ações. O relatório aponta também que, apesar de progressistas, os governos nesses estados não garantem uma polícia não violenta.

O observatório acompanhou também eventos cujas secretarias estaduais não monitoram, como linchamento e chacina. No caso do Maranhão, por exemplo, os órgãos estaduais não catalogam a cor das vítimas, o que impede a criação de políticas públicas adequadas e mascara o racismo estrutural. O boletim Pele Alvo, publicado pela Rede no ano passado, indicava que 90% dos mortos eram negros. 

 

No geral, a pesquisa analisa que há uma distribuição nos números que se assemelham aos demais estados monitorados pela Rede de observatório. Na sequência, abaixo de policiamento, aparecem eventos envolvendo armas de fogo. Junto às ações policiais, são violências que tradicionalmente ocupam as páginas dos jornais quando a pauta é segurança. Nesse indicador, o número de execuções chega a 121 só no Piauí – um número que se eleva enquanto as facções locais (Bonde dos 40, Comando Vermelho e PCC) expandem sua atuação e disputam territórios, sobretudo em Teresina.

 

Páginas policiais 

O relatório também questiona a forma como as notícias sobre violência são disseminadas nos jornais locais, que resumem a segurança pública apenas a policiamento. “São ações que corroboram para a manutenção do discurso da guerra às drogas, que têm como principal objetivo eliminar negros e pobres, e não acabar com o tráfico”, diz um dos trechos.

Os dados mostram que 85% dos eventos de policiamento são operações policiais, chegando ao número de 398 operações, e a Polícia Militar esteve presente na maioria delas (61,8%) – dinâmica que se repete nos outros cinco estados observados pela Rede. No caso do Piauí, observa-se que a maioria das operações tem motivações diversas (310), seguido por flagrantes, o que aponta para uma política de segurança sem uso da inteligência para o combate qualificado ao crime.

Outro destaque é a vitimização de agentes de segurança. Enquanto o Maranhão registrou somente 4 vítimas, no Piauí monitorou-se 22 eventos de violência – incluindo um suicídio. O estado do Piauí tem um dos menores contingentes policiais do país, com seis mil policiais – metade atuando em Teresina. Em 2018 foi lançado o plano de segurança pública – documento que orienta as ações na área de segurança dos estados. “Ignorando a realidade de sobrecarga de trabalho e falta de preparo dos policiais. Esse descaso explica a violência que a polícia produz e sofre no Piauí”, aponta o relatório. 

A Rede de Observatórios é um projeto do Centro de Estudos de Segurança e Cidadania (CESeC), com apoio da Fundação Ford, que começou como uma forma de responder aos problemas de falta de transparência e de abertura de dados sobre criminalidade e violência. De acordo com o núcleo de pesquisadores, a ausência e omissão do estado em produzir e divulgar amplamente dados confiáveis para pensar políticas públicas, faz com que a sociedade civil se empenhe em produzir dados fundamentais para a análise da vida em sociedade. 

sexta-feira, 22 de novembro de 2024
Categorias: Reportagem

0 comentário

Deixe um comentário

Avatar placeholder

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *