Ana* levantou-se da cama, tomou café e foi se arrumar para ir ao estágio. Era mais um dia comum em sua rotina, quando ouviu a sua mãe dizer: “Ana, depois eu e seu pai queremos conversar com você”. Foi o suficiente para a jovem entrar em mais uma crise de ansiedade.
“Saí do quarto toda me tremendo, eu não conseguia controlar nem mais disfarçar a crise, os sinais eram evidentes”, relata. “A ansiedade tenciona cada músculo do meu corpo, não consigo respirar”, segue narrando. “Me faz sentir a todo segundo que tem alguém chateado com algo que eu fiz ou falei”.
Depois desse episódio, Ana resolveu buscar ajuda. No estágio, foi aconselhada pelas colegas a ir em busca de um psicólogo. “Eu não tinha plano de saúde na época, geralmente é 200 reais por sessão, e a oferta de psicologia na universidade era através do whatsapp, por conta da pandemia”, explica. “Fiz o cadastro, mas nunca recebi retorno”.
Ao contar para sua mãe sobre os episódios de crise de ansiedade, a receptividade diante do assunto não foi das melhores. “Ela já veio logo dizendo que tudo meu é exagerado, que sempre fui assim desde criança e que estava vendo demais sobre essas coisas bobas de depressão e ansiedade e acabava ficando impressionada”, relembra.
Um resumo científico divulgado em março deste ano pela Organização Mundial de Saúde aponta que, no primeiro ano da pandemia de Covid-19, a prevalência global de ansiedade e depressão aumentou em 25%. O resumo – baseado no impacto da doença na saúde mental e nos serviços de saúde – mostra que a pandemia afetou a saúde mental principalmente de jovens e, ainda, que as mulheres foram mais severamente impactadas do que os homens.
O impacto poderia ser diferente se Ana e vários jovens, que não conseguiram acessar os serviços de saúde, estivessem com um aplicativo no celular que facilita a busca por ajuda e informações em apenas um clique. Foi o que a concludente do curso tecnólogo em Análise e Desenvolvimento de Sistemas, Karine Nunes, pensou.
Desde o início do curso, Karine e outros alunos da turma do IFPI campus Corrente – sul do estado – eram estimulados pelos professores a pensar o que poderia ser desenvolvido através da tecnologia para melhorar a vida das pessoas.
“Sempre que pensava em desenvolver algo, olhava para a área da saúde e, como ansiedade é um tema sensível que afeta muitas pessoas – principalmente nos últimos anos – pensei em fazer algo que fosse capaz de ajudá-las”, explica a jovem.
Karine então resolveu criar um aplicativo, mais conhecido como chatbot – um software capaz de manter uma conversa com um usuário humano em linguagem natural, por meio de aplicativos de mensagens – que ajudasse pessoas passando por transtorno de ansiedade.
O chatbot Serenity fornecer, como é denominado o aplicativo, traz informações sobre ansiedade, seus sintomas e tratamentos, através de mensagens. O app também fornece alguns contatos onde os usuários podem encontrar ajuda profissional e gratuita.
O objetivo principal é disponibilizar informações básicas sobre a ansiedade. “Estou buscando melhorar para que ele possa manter uma conversa com usuário cada vez mais natural e informativa”, explica a desenvolvedora. “Além de ser capaz de fazer triagens ajudando com agilidade os usuários na busca por profissionais”, explica.
Felipe Gonçalves, professor e orientador de Karine, é mestre em Sistemas de Comunicação e Automação. Ele diz que, atualmente, é impossível dissociar informação e tecnologia. A promoção da saúde física e mental, acredita, inicia no alerta e na divulgação de informações sobre o assunto, de modo a alcançar o máximo de pessoas possíveis. “É aí que a tecnologia entra como uma aliada forte”, diz. “O principal lema do IFPI é incentivar os alunos a pensar e construir soluções para a comunidade em nível local, estadual e nacional, a exemplo do trabalho da Karine”, ressalta.
Os smartphones, aplicativos e outras ferramentas digitais se tornaram praticamente uma extensão dos seres humanos. Os aplicativos de saúde têm um papel importante neste contexto. Uma pesquisa realizada pela consultoria internacional App Annie apontou que, só em 2020, o número de downloads de apps de saúde e bem-estar cresceu 45% no Brasil, superando a média internacional.
Além dos aplicativos direcionados especificamente à área médica, como por exemplo, aqueles desenvolvidos para prestar informações sobre a Covid-19, as soluções voltadas à meditação, exercícios físicos e yoga também tiveram um salto expressivo de usuários.
Em relação ao aplicativo de Karine, a ideia é que o smartphone – um aparelho cujo uso em excesso é, em grande parte, responsável pelo aumento da ansiedade entre os jovens – passe a ser um aliado no combate à doença.
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