quinta-feira, 21 de novembro de 2024

O que querem as mulheres?

Economia e empregabilidade são temas prioritários para mulheres - o maior quantitativo de eleitores do país

29 de setembro de 2022

Edição Luana Sena

Esta reportagem integra a série “Francisca Trindade” ♀ , sobre a representatividade de gênero na política. Participaram Vitória Pilar (reportagem), Luana Sena (edição) e Aline Santiago (infografia). 

 

Maria de Fátima Alves criou os três filhos sozinha. Largou a escola na primeira gravidez e nunca mais voltou. Ficou sem completar o ensino médio e procurou casas de família para prestar trabalho doméstico. Hoje, aos 42 anos, ela trabalha vendendo lanches na zona Leste de Teresina. O lugar é longe da sua casa, localizada no bairro Santa Maria da Codipi, o que a faz sair muito cedo e retornar apenas no final do dia. Um total de  seis ônibus para ir e voltar. Quase não resta tempo para assistir noticiário ou acompanhar os candidatos na corrida eleitoral. Ela ainda não sabe em quem votar. Até agora, nenhum candidato ao governo do Piauí, nem deputados, conseguiram chamar sua atenção. Maria de Fátima conta com a ajuda das filhas para decidir qual número cravar na urna. 

Mulheres como Maria fazem parte de uma parcela decisiva para definir as eleições deste ano. Em 2022, as mulheres representam 53% do eleitorado total. São 8,6 milhões de eleitoras mulheres (um total de 79,2 milhões) a mais do que eleitores homens (70,6 milhões). O quantitativo, sozinho, é capaz de eleger um candidato à presidência. Nos estados, elas também são maioria e podem ditar os rumos dos cargos de governadores. 

Mesmo fundamentais na decisão dos vencedores, as mulheres ainda possuem uma baixa taxa de participação na hora de votar. Nas eleições de 2018, quase 33 milhões de mulheres não escolheram um nome nas urnas – quase 20% do eleitorado feminino. Os dados foram levantados pelo movimento Elas que Decidem. 

Também no pleito de 2018, mulheres de 16 a 24 anos eram quase 10% do eleitorado geral. As mulheres com idade de 25 a 34 anos representavam 11%. No Nordeste, são quase 20,9 milhões de eleitoras, representando 14,3% do eleitorado. A última pesquisa do Datafolha estimou que quase 46,4% ainda estão sem candidato nestas eleições. Uma realidade bem parecida com a de Maria de Fátima.

Por outro lado, o grau de volatilidade do voto feminino é bem maior que o dos homens. Quando o assunto é trocar o voto, quase 40% afirmam que podem mudar de ideia até o dia das eleições. Uma pesquisa inédita, encomendada pela revista Veja, mostrou que para conseguir a fidelidade dos votos delas, os pontos-chaves são a economia e a empregabilidade. 

Fonte: Revista VEJA.

De acordo com a cientista política Nara Pavão, qualquer coisa que interfere na vida doméstica é um assunto capaz de fisgar o voto feminino. A alta dos preços, a perda do poder de compra e os impactos da fome agem de forma concreta para decidir o rumo dos votos das mulheres. Isso porque, quando assoladas por esses problemas, são elas as principais – e primeiro grupo – a serem afetadas pela pobreza e a crise econômica. “Elas costumam pensar na desestruturação da família, nos filhos desempregados e nas contas”, explica a cientista. “Se forem as mães solos, a situação fica ainda mais drástica”, complementa. 

Esse medo recai mais nas mulheres que nos homens. Durante a pandemia, por exemplo, a situação apertou mais para elas. Maria de Fátima, a vendedora de lanches, sentiu na pele as incertezas do período de crise. Em casa, recebendo parcelas do auxílio desemprego, apenas a filha do meio, Diovana Sampaio, estava empregada em uma loja de eletrodomésticos e ajudava nas contas da casa. A jovem, de 23 anos, ganhava um salário mínimo e comissões. Quanto mais os dias passavam, sem vacina e propostas de emprego, a chefe de família se preocupava com o acúmulo de contas e com o futuro dos filhos. 

A preocupação agora é entender a nova geração de mulheres da família. Diovana quer terminar a graduação de pedagogia e se equilibrar entre a faculdade e o emprego. Ela e a irmã concordam com a insegurança nas ruas, na volta pra casa e em qualquer lugar. Quando o assunto é violência, elas não sentem firmeza no aparato da segurança pública – e particularmente, nem nas leis. “É muito ruim se sentir vulnerável o tempo todo”, declarou à reportagem. 

Cássia, de 18 anos, compartilha do mesmo sentimento de medo. A adolescente terminará em breve o ensino médio e quer ser psicóloga. Se não conseguir passar no ENEM, vai arregaçar as mangas e seguir os passos de Diovana: trabalhar e pagar a graduação. As filhas de Maria de Fátima almejam uma renovação nestas eleições. Proteção às mulheres e oportunidades de emprego são os impulsionadores para mudar a realidade delas. 

Família da Maria de Fátima: voto não é influenciado pelo único homem da casa (Foto: arquivo pessoal)

Se a entrada das mulheres na política foi tardia, agora, elas tentam recuperar o atraso. Como a família de Maria de Fátima, o voto feminino não costuma ser influenciado pelos homens – na casa das mulheres vive o filho mais velho, Júlio César, de 25 anos. “Há uma tendência de que cada vez mais o voto feminino seja decisivo, não somente nas urnas, mas que force os candidatos a enxergarem elas e implantar políticas extremamente necessárias”, explica a cientista política Nara. E Diovana concorda: “Os políticos que não pensam em nós, não merecem nossos votos”, exclama. Para ela isso é bem mais que uma convicção. É palavra de mulher. 

 

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