Antes das 21h, no último domingo (2), boa parte dos piauienses já sabia que o matemático Rafael Fonteles (PT) era o novo governador do Piauí. Concorrendo pela primeira vez a um cargo público, mirando o Palácio do Karnak, Fonteles conseguiu desbancar o médico Sílvio Mendes (União Brasil), ex-prefeito de Teresina, na corrida eleitoral. O resultado contrariou boa parte das pesquisas divulgadas durante a campanha, que apontava a possibilidade de segundo turno ou vitória de Mendes. A resposta veio nas urnas: com a eleição de Fonteles, o PT conseguiu manter o domínio político na disputa e ainda conseguiu eleger o ex-governador, Wellington Dias, para a única cadeira no Senado.
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A vitória de Fonteles, em primeiro turno, teve um gosto amargo para o ministro da Casa Civil, Ciro Nogueira (PP). Nogueira foi o principal articulador da campanha do ex-prefeito, que ficou em segundo lugar na disputa. A vice do candidato, Iracema Portella (PP), é ex-esposa do ministro e foi indicação pessoal dele para o pleito. A chapa majoritária apoiava diretamente Joel Rodrigues (PP), ex-prefeito de Floriano, para a cadeira no Senado. Rodrigues disputou a cadeira com Dias. A ideia era montar uma base que pudesse interromper o legado de quase duas décadas de PT no estado.
Lá do Planalto, o ministro de Bolsonaro (PL) fazia malabarismo tentando impulsionar a disputa estadual ao passo que tentava ofuscar o presidente na mesma campanha – tarefa difícil até mesmo para Nogueira. Em julho deste ano, a vice-presidente do PDT no Piauí, Amanda Costa, desafiou as demais lideranças da agremiação e, aos gritos de “Fora Bolsonaro”, manifestou repúdio à presença do presidente do PP na convenção partidária em Teresina. Em dezembro do ano passado, Nogueira foi recebido sob vaias e gritos de “fascistas” pela comunidade quilombola dos Potes. Os moradores estavam insatisfeitos com a demora da entrega das UBS’s em São João da Varjota.
O reduto eleitoral de Nogueira se revelava hostil para o ministro e homem-forte de Bolsonaro. Um dos sintomas da apatia pelo atual governo foi quando em show do cantor Gusttavo Lima, na cidade de Oeiras, o ministro foi recebido a vaias. O que veio a se explicar também com o resultado nas urnas, quando o Piauí se revelou o estado brasileiro que deu maior percentual de votos ao candidato Lula (PT) no 1º turno da eleição presidencial. Se a disputa dependesse apenas dos votos piauienses, o petista teria ganhado com 74,25% do eleitorado, percentual de votos válidos logrados no estado para Lula – Bolsonaro saiu com pouco menos de 20%.
O percentual irrisório para o presidente que tenta a reeleição ajuda a explicar as poucas menções a Bolsonaro na sua chapa. Sílvio e Joel chegaram a declarar na imprensa que não eram ligados ao presidente. Mendes chegou a falar em debates televisionados que não importava quem estivesse no poder, pois o trabalho dele seria para o povo. Rodrigues reforçou o discurso afirmando que qualquer menção do candidato ao Senado relacionada ao atual presidente poderia ser classificada como “fake news”. Nesta quinta-feira (6), Silvio Mendes declarou à imprensa que vai apoiar a reeleição de Jair Bolsonaro à presidência. É a primeira vez que ele assume compromisso com o presidente. Rodrigues também estava presente e corrobora com o apoio.
O padrinho político do trio, Nogueira, foi ficando sem saída. Mesmo com a vantagem de Mendes na maioria das pesquisas, sentiu as investidas de Fonteles se aproximando na reta final, quando o cenário eleitoral mirava um segundo turno apertado entre os candidatos ao governo estadual. Foi o que o teria feito ensaiar férias do ministério na semana que antecedeu o primeiro turno, mas acabou desistindo. Conforme informações, a ideia não foi bem recebida entre aliados e apoiadores em Brasília. As férias do ministro não duraram sequer um final de semana.
A derrota de Nogueira no seu berço eleitoral traz paradoxos em relação à articulação do ministro. Já no início desta semana, informações de Brasília apontavam um apoio de Rodrigo Garcia (PSDB), governador de São Paulo, a Bolsonaro. A confirmação veio com uma declaração em metáforas pelo presidente: “Estou em namoro com Garcia”. E o cupido era Nogueira que, na terça-feira, visitava o Palácio dos Bandeirantes para garantir mais um casamento bolsonarista. Sem base em casa, o ministro tenta correr contra o tempo em outros estados para articular seus tentáculos e garantir votos ao presidente.
Nesta semana, veio a confirmação de que o presidente Jair Bolsonaro viria a Teresina até o segundo turno das eleições, dia 30 de outubro. Ele pretende fazer uma dobradinha: organizar um cronograma para ter agenda em Teresina e São Luís (MA), no mesmo dia. A corrida seria para reforçar a base no Nordeste, região onde o presidente obteve menos votos no país. A chegada foi confirmada pela jornalista Samantha Cavalca, presidente do Partido Liberal (PL) no Piauí. Cavalca é uma bolsonarista convicta e classifica-se como porta-voz do bolsonarismo no estado. Nesse pleito, ela se lançou como deputada estadual pela sigla, mas não conseguiu o quantitativo para eleição. Naturalmente seria Nogueira, o piauiense no Planalto, a dar a notícia em primeira mão, mas agora Samantha tem tomado o microfone.
Em suas redes sociais, Nogueira não comentou nada a respeito da vinda de Bolsonaro ao Piauí. O ministro também tem se mantido em silêncio sobre o resultado nas urnas, que garantiu a vitória petista no estado. No Twitter, o ministro era assíduo com críticas a Wellington Dias e Rafael Fonteles. Nunca perdia a chance de ressaltar Sílvio e Joel como uma dupla implacável – mas claro, sem associá-los ao presidente. Se antes o ministro era cauteloso em fazer ligações dos seus candidatos ao Piauí com o presidente, resta saber se, para o segundo turno, apoiar Bolsonaro será tudo que lhe restou.
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