quinta-feira, 21 de novembro de 2024

O silêncio do ministro

Com derrota bolsonarista no Piauí, Ciro Nogueira articula seus tentáculos para garantir votos ao presidente longe de casa

06 de outubro de 2022

Antes das 21h, no último domingo (2), boa parte dos piauienses já sabia que o matemático Rafael Fonteles (PT) era o novo governador do Piauí. Concorrendo pela primeira vez a um cargo público, mirando o Palácio do Karnak, Fonteles conseguiu desbancar o médico Sílvio Mendes (União Brasil), ex-prefeito de Teresina, na corrida eleitoral. O resultado contrariou boa parte das pesquisas divulgadas durante a campanha, que apontava a possibilidade de segundo turno ou vitória de Mendes. A resposta veio nas urnas: com a eleição de Fonteles, o PT conseguiu manter o domínio político na disputa e ainda conseguiu eleger o ex-governador, Wellington Dias, para a única cadeira no Senado. 

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A vitória de Fonteles, em primeiro turno, teve um gosto amargo para o ministro da Casa Civil, Ciro Nogueira (PP). Nogueira foi o principal articulador da campanha do ex-prefeito, que ficou em segundo lugar na disputa. A vice do candidato, Iracema Portella (PP), é ex-esposa do ministro e foi indicação pessoal dele para o pleito.  A chapa majoritária apoiava diretamente Joel Rodrigues (PP), ex-prefeito de Floriano, para a cadeira no Senado. Rodrigues disputou a cadeira com Dias. A ideia era montar uma base que pudesse interromper o legado de quase duas décadas de PT no estado. 

Lá do Planalto, o ministro de Bolsonaro (PL) fazia malabarismo tentando impulsionar a disputa estadual ao passo que tentava ofuscar o presidente na mesma campanha – tarefa difícil até mesmo para Nogueira. Em julho deste ano, a vice-presidente do PDT no Piauí, Amanda Costa, desafiou as demais lideranças da agremiação e, aos gritos de “Fora Bolsonaro”, manifestou repúdio à presença do presidente do PP na convenção partidária em Teresina. Em dezembro do ano passado, Nogueira foi recebido sob vaias e gritos de “fascistas” pela comunidade quilombola dos Potes. Os moradores estavam insatisfeitos com a demora da entrega das UBS’s em São João da Varjota

O reduto eleitoral de Nogueira se revelava hostil para o ministro e homem-forte de Bolsonaro. Um dos sintomas da apatia pelo atual governo foi quando em show do cantor Gusttavo Lima, na cidade de Oeiras, o ministro foi recebido a vaias. O que veio a se explicar também com o resultado nas urnas, quando o Piauí se revelou o estado brasileiro que deu maior percentual de votos ao candidato Lula (PT) no 1º turno da eleição presidencial. Se a disputa dependesse apenas dos votos piauienses, o petista teria ganhado com 74,25% do eleitorado, percentual de votos válidos logrados no estado para Lula – Bolsonaro saiu com pouco menos de 20%.

O percentual irrisório para o presidente que tenta a reeleição ajuda a explicar as poucas menções a Bolsonaro na sua chapa. Sílvio e Joel chegaram a declarar na imprensa que não eram ligados ao presidente. Mendes chegou a falar em debates televisionados que não importava quem estivesse no poder, pois o trabalho dele seria para o povo. Rodrigues reforçou o discurso afirmando que qualquer menção do candidato ao Senado relacionada ao atual presidente poderia ser classificada como “fake news”. Nesta quinta-feira (6), Silvio Mendes declarou à imprensa que vai apoiar a reeleição de Jair Bolsonaro à presidência. É a primeira vez que ele assume compromisso com o presidente. Rodrigues também estava presente e corrobora com o apoio. 

O padrinho político do trio, Nogueira, foi ficando sem saída. Mesmo com a vantagem de Mendes na maioria das pesquisas, sentiu as investidas de Fonteles se aproximando na reta final, quando o cenário eleitoral mirava um segundo turno apertado entre os candidatos ao governo estadual. Foi o que o teria feito ensaiar férias do ministério na semana que antecedeu o primeiro turno, mas acabou desistindo. Conforme informações, a ideia não foi bem recebida entre aliados e apoiadores em Brasília. As férias do ministro não duraram sequer um final de semana. 

A derrota de Nogueira no seu berço eleitoral traz paradoxos em relação à articulação do ministro. Já no início desta semana, informações de Brasília apontavam um apoio de Rodrigo Garcia (PSDB), governador de São Paulo, a Bolsonaro. A confirmação veio com uma declaração em metáforas pelo presidente: “Estou em namoro com Garcia”.  E o cupido era Nogueira que, na terça-feira, visitava o Palácio dos Bandeirantes para garantir mais um casamento bolsonarista. Sem base em casa, o ministro tenta correr contra o tempo em outros estados para articular seus tentáculos e garantir votos ao presidente. 

Nesta semana, veio a confirmação de que o presidente Jair Bolsonaro viria a Teresina até o segundo turno das eleições, dia 30 de outubro. Ele pretende fazer uma dobradinha: organizar um cronograma para ter agenda em Teresina e São Luís (MA), no mesmo dia. A corrida seria para reforçar a base no Nordeste, região onde o presidente obteve menos votos no país. A chegada foi confirmada pela jornalista Samantha Cavalca, presidente do Partido Liberal (PL) no Piauí. Cavalca é uma bolsonarista convicta e classifica-se como porta-voz do bolsonarismo no estado. Nesse pleito, ela se lançou como deputada estadual pela sigla, mas não conseguiu o quantitativo para eleição. Naturalmente seria Nogueira, o piauiense no Planalto, a dar a notícia em primeira mão, mas agora Samantha tem tomado o microfone.

Em suas redes sociais, Nogueira não comentou nada a respeito da vinda de Bolsonaro ao Piauí. O ministro também tem se mantido em silêncio sobre o resultado nas urnas, que garantiu a vitória petista no estado. No Twitter, o ministro era assíduo com críticas a Wellington Dias e Rafael Fonteles. Nunca perdia a chance de ressaltar Sílvio e Joel como uma dupla implacável – mas claro, sem associá-los ao presidente. Se antes o ministro era cauteloso em fazer ligações dos seus candidatos ao Piauí com o presidente, resta saber se, para o segundo turno, apoiar Bolsonaro será tudo que lhe restou. 

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