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“Tia, o que vai acontecer comigo agora?”

Menina de 11 anos é estuprada e engravida pela segunda vez em Teresina; crianças são as principais vitimas de abuso sexual

13 de setembro de 2022

Edição Luana Sena

Na zona rural de Teresina, uma menina de 10 anos engravidou após ser vítima de estupro. Isso aconteceu no ano passado e, um ano depois, a criança foi vítima de violência sexual mais uma vez. Na primeira ocasião, ela teve o pedido de aborto negado pelos próprios pais – mesmo sabendo da gestação de risco com a pouca idade. Como um filme de terror em looping, a situação agora se repete.

O caso veio à tona quando o pai da menina acionou o Conselho Tutelar na última semana. Não para denunciar o agressor, mas para que a menina pudesse ser levada. O responsável alegava que a criança tinha mau comportamento. O episódio chamou a atenção dos conselheiros, e a menina foi levada para fazer exames, entre eles, o Beta HCG, que identificou a gestação de 10 semanas e um dia. 

Desde que o primeiro filho nasceu, a menina parou de frequentar a escola. A criança e seu bebê, fruto do primeiro abuso, foram retirados do abrigo do Conselho Tutelar, onde estavam há um mês, e retornaram à casa do pai, em Teresina. O pai tem a guarda de ambos. A mãe da menina, divorciada do pai, vive em outra casa. 

Em entrevista ao G1 Piauí, o pai afirma que a família não pretende solicitar o aborto legal desta segunda gestação. A conselheira tutelar, Renata Bezerra, que está acompanhando o caso, aconselhou a família para a interrupção da gravidez. “A menina tem vontade de realizar o aborto, a mãe não autoriza, alega que é crime”, comenta Renata. Segundo a lei brasileira, são permitidas a interrupção em dois casos: quando a gestação traz risco à vida da mãe ou quando a gravidez é decorrente de um estupro.  

Dados da Secretaria de Estado da Saúde (Sesapi) mostram que, no Piauí, 1.697 meninas de até 14 anos deram à luz nos últimos quatro anos. Os maiores casos de complicações na gravidez são na adolescência. O Ministério da Saúde aponta que, a cada mês, pelo menos uma criança de 10 a 14 anos morre em decorrência de complicações da gestação. 

O cenário é ainda pior quando se observa o estado. No Piauí, cerca de 79% dos crimes de violência sexual acontece contra meninas, segundo estudo do Observatório Mulher Teresina. Em Teresina, os dados também não são animadores: somente de janeiro a abril de 2022, o 4° Conselho Tutelar, na zona Leste da capital, registrou 181 denúncias de abusos contra crianças e adolescentes. A principal faixa etária é entre 0 e 7 anos e os principais abusadores, no geral, são pais, avós, padrastos, familiares e vizinhos. 

Leia mais: Quase 90% dos casos de violência sexual contra crianças e adolescentes são registrados no ambiente familiar

No Piauí, por lei, vítimas de violência sexual podem ser atendidas pelos profissionais da área de segurança pública e rede de atendimento do SUS, acionando assim as competências do Ministério da Justiça e do Ministério da Saúde. Menores de idade são encaminhados para a rede de proteção, como o Centro de Referência da Assistência Social (CRAS) ou Centro de Referência Especializado de Assistência Social (CREAS). 

No mês de maio, as entidades realizam eventos de combate ao abuso e exploração sexual contra crianças e adolescentes. Porém, o próprio  presidente do Conselho Nacional dos Direitos de Crianças e Adolescentes (Conanda), Diego Alves, afirmou que, neste ano, o governo federal deixou de implementar o Plano Nacional de Enfrentamento da Violência Sexual contra Crianças e Adolescentes, aprovado pelo Conanda em 2000. 

O presidente citou ainda o levantamento feito pelo Unicef e pelo Ipea, segundo o qual o Brasil, entre 2016 e 2019, destinou em média apenas 3,2% dos recursos públicos federais a crianças e adolescentes. “Isso está muito longe de assegurar o que a Constituição preconiza: a criança como prioridade absoluta”, lamentou. Ele reforçou também que focar os esforços em apenas um mês do ano não tira milhares de crianças e adolescentes da mira de abusos cometidos cotidianamente

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