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Um ano depois

Primeiros vacinados relembram emoção e Piauí enfrenta desafios, como a desinformação, para concluir imunização

18 de janeiro de 2022

Edição Luana Sena

Faltava menos de uma hora para o início das primeiras aplicações das vacinas contra à Covid-19 no Piauí, quando Amariles Borba, 77 anos, soube que havia sido indicada pela Fundação Municipal de Saúde (FMS) de Teresina para ser uma das seis primeiras pessoas a receberem o imunizante. Ansiedade e felicidade resumiam o trajeto da sua casa até a sede da Secretaria Estadual de Saúde do Piauí (Sesapi), onde, há exatamente um ano, foi vacinado um grupo simbólico para marcar a chegada das doses no estado.  

Amariles, que atua há 22 anos na Vigilância da Saúde, passou mais de um ano em trabalho remoto para se proteger do vírus. Em junho do ano passado, com as duas doses e o reforço – recomendados pela Organização Mundial de Saúde -, retornou à sede da FMS para realizar suas atividades. A médica, que não teve reações adversas à vacina em nenhuma das aplicações, comemora que após o início da vacinação, tem visto os números de internações e óbitos pela doença serem reduzidos diariamente no Piauí. “Vai dando um alívio e esperança de dias melhores”, comenta.

Reconhecida por sua atuação, Amariles Borba foi uma das primeiras pessoas a tomar a vacina no Piauí (Foto: Sesapi)

Mesmo com muitos anos de experiência em campanhas de vacinação em Teresina, ela continua estudando e pesquisando sobre como tomar as melhores medidas de combate à Covid-19. Para ela, a falta de informação é o que tem feito parte da população cair no negacionismo “anti-vacina”. “Tem gente que não lê, ou que tá lendo pela metade, ou quer se enganar”, frisa a médica. “As vacinas têm salvo a vida das pessoas por anos. Em Teresina mesmo, as crianças já não morrem de tétano e difteria, não é por acaso”, observa. “São as vacinas. É a ciência”, conclui Amariles. 

Mesmo imunizada, a médica não abre mão dos cuidados básicos: uso de máscara, higienização constante das mãos e desvio de aglomerações tem feito parte da rotina de Amariles desde o início da pandemia. Ela indica que os cuidados, aliado à vacina, são fatores que lhe garantiram a proteção, até agora, contra o vírus.

Para o médico obstetra Joaquim Vaz, de 75 anos, o primeiro a estender o braço para a vacina um ano atrás, a emoção permanece. Para ele, o momento representou uma “luz no fim do túnel” para a humanidade – em especial para os profissionais da saúde. Ele conta que inicialmente, quando soube que seria o primeiro vacinado, chegou a sugerir outros nomes em seu lugar. Porém, ficou mais emocionado quando soube que os próprios colegas de trabalho o indicaram para participar do momento histórico.

Joaquim, que já realizou mais de 20 mil partos – entre eles, o 3º parto da Maternidade Dona Evangelina Rosa (MDER), chegou a fazer atendimentos através da tela do computador pela primeira vez por conta do isolamento social. Imunizado com as duas doses e o reforço, ver os atendimentos e pessoas voltando para suas rotinas – mesmo com as medidas de segurança precisando serem seguidas de forma rígida – reforça o sentimento vivido durante a imunização: esperança. 

 

O médico Joaquim Vaz minutos após receber a primeira dose: “Esse compromisso é de todos” (Foto: Sesapi)

 

O médico, que também é pesquisador científico, olha com tristeza o movimento de negar a eficácia da vacina contra à Covid-19. Trabalhando principalmente com crianças, ele ressalta que a imunização não tem cor, status social ou partido, e a intenção é única: salvar vidas. “Eu acredito muito na ciência porque ela é fundamentada na verdade, não em teorias mirabolantes”, pontua. “Enquanto médico, mas principalmente enquanto cidadão, é meu dever provocar o compromisso fundamental de valorizar a vida”, destaca. 

Joaquim possui três netos e, agora, aguarda a vez dos pequenos receberem suas doses. Com a vacinação sendo estendida, finalmente, às crianças, Joaquim lamenta que ainda haja dúvidas sobre o imunizante – enquanto todo o mundo presencia sua eficácia. “Esse compromisso é de todos”, finaliza.

Vacinas e desinformação

Quase 83% da população piauienses que já recebeu a 1° dose e cerca de 75% está com a imunização completa – desses, 12% receberam ainda a dose de reforço. Ao todo, são cerca de 5.625.000 contra Covid-19 aplicadas no Piauí desde a sua chegada, no dia 18 de janeiro de 2021. 

Para crianças, a vacinação iniciou no último sábado (15), em Piripiri, onde Marcos Vinícius de 7 anos, criança indígena da tribo Tabajara, foi o primeiro a receber a dose. Espera-se que mais de 300 mil crianças, entre 5 e 11 anos, possam ser vacinadas em todo o Piauí. A vacina aplicada será a versão pediátrica da Pfizer/Comirnaty.

 

Indígena da tribo Tabajara foi primeira criança vacinada no Piauí (Foto: Sesapi)

 

Enfrentando desafios de produção ao longo de 2020 e logística de entrega no ano seguinte, a desinformação foi um grande obstáculo para a imunização. Atualmente, no Brasil, cerca de 20% do conteúdo falso divulgado nas redes sociais tem as vacinas como alvo. 

Os dados foram apurados pela Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz), em parceria com o Núcleo de Pesquisa em Jornalismo e Comunicação da Universidade Federal do Piauí (UFPI), que analisou sites e aplicativos de mensagens durante um ano –  26 de março de 2020 e 31 de março de 2021. Ainda na pesquisa, a Fiocruz – uma das instituições pesquisadora da vacina – também foi apontada como alvo de fake news no meio digital. 

Na sequência, foi possível identificar outros temas com disseminação recorrente de fake news. Entre elas, além da desinformação sobre vacinas, o estudo da Fiocruz revelou outros temas relacionados como tratamento precoce contra a Covid-19 (18,6%); medidas preventivas contra a doença (15,8%); métodos caseiros de prevenção e cura (11,9%) e dados estatísticos manipulados sobre óbitos, contágio e recuperados (10,3%). As informações falsas de corrupção sobre hospitais de campanha (3,6%) também constam no estudo.

De acordo com a pesquisadora Claudia Garlhardi, esses estudos são fundamentais para aprofundar e entender o ecossistema da desinformação e como eles impactam. “A avalanche de  desinformação na pandemia tem impactado no ‘abandono vacinal’ e na adesão a tratamentos precoces sem eficácia científica comprovada”, destaca. “Também colabora para o descrédito da ciência, das instituições globais de saúde e de ações governamentais, além de propagar pânico, colocando a vida do cidadão em risco”, alerta.

Para Cláudia, é importante que haja um fortalecimento da imprensa para poder barrar esse fluxo que vem de forma alternativa à mídia tradicional, mas principalmente, a checagem de todo e qualquer conteúdo que possa parecer duvidoso ou tendencioso. “Os achados revelam que o fluxo de conteúdo desinformacional é movediço”, frisa a pesquisadora. “Os produtores dessas notícias, no entanto, buscam sempre atuar nas redes sociais com menor ação efetiva no combate à desinformação e em novas redes que surgem”, afirma Cláudia. 

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Categorias: Reportagem

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