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Votar é urgente

Rumo ao 2º turno das eleições, abstenção e desvalorização do voto são riscos à preservação do sistema democrático

24 de outubro de 2022
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Edição Luana Sena

Em menos de uma semana, os brasileiros irão às urnas mais uma vez para escolher o presidente no segundo turno das eleições. Durante o hiato que separou a primeira ida às urnas neste pleito, do próximo dia 30 de outubro, campanhas e eleitores, mesmo de partidos oponentes, concentraram esforços na mesma missão: convencer as pessoas a irem às urnas.

A matemática dos votos não costuma ser uma equação simples. Sobretudo em um segundo turno onde há fatores impossíveis de calcular, como a transferência de votos dos candidatos que ficaram pelo meio do caminho na disputa (Simone Tebet (MDB) e Ciro Gomes (PDT)) e o percentual daqueles que deixaram de votar.

No primeiro turno destas eleições, o eleitorado brasileiro que não foi às urnas bateu um recorde: 20,79% de abstenção. Ao todo, quase 32,4 milhões de eleitores regulares não votaram. O número é cinco vezes a diferença entre Lula (PT) e Bolsonaro (PL) no primeiro turno: pouco mais de 6,19 milhões de votos (5,23% dos votos válidos).

 


No Piauí,
71.259 mil piauienses não votaram em nenhum candidato divididos entre o voto em branco (0,92%) ou nulo (2,45%). Além disso, 17,69% dos piauienses aptos ao voto sequer compareceram às urnas, o que levou o estado a registrar a 5ª maior abstenção do país. Para o cientista político André Gonçalves, os índices são preocupantes e refletem certa incompreensão sobre a importância das eleições e da política.

À reportagem, o pesquisador relembrou que, historicamente, o voto nulo é usado como uma forma de protesto, mas pode parecer utópico diante das condições dos sistemas democráticos atuais. “Não entendo ser necessário afirmar se é ‘certo’ ou ‘errado’ mas, particularmente nesta eleição, a não-opção deliberada é um risco”, explicou. “Há claramente um campo pouco afeito à democracia, usando o próprio sistema para se manter no poder e buscar legitimidade”, alerta, se referindo aos ataques sofridos pelos sistemas democrático e eleitoral.

 


Ao passo em que votar é um direito, comparecer aos locais de votação é uma obrigação para todo cidadão de 18 a 70 anos que seja alfabetizado, de acordo com a legislação. Para André, além de um direito individual, o voto consiste numa obrigação coletiva, que tem consequências práticas consideráveis, independente da legislação. “É um poder-dever, que ultrapassa os interesses individuais e tem efeito na coletividade”, afirma.

Aos 94 anos, João Pedro Santos entende a urgência e importância de ir às urnas. Eleitor desde os 18 anos de idade, ele relatou ao oestadodopiaui.com que nunca negligenciou uma eleição. “Em menos de dois meses completo 95 anos e nunca falhei em deixar de votar”, afirma sorridente e orgulhoso. Sobre a relevância de ir às urnas, ele ressaltou: “Eu acho importante. É uma forma de manter a democracia, escolhendo alguém que faça mais por nós, principalmente pelos mais pobres”.

Há mais de duas década João entrou para o grupo cujo voto é facultativo. Mesmo sem a obrigatoriedade, no entanto, ele segue exercendo esse direito. No primeiro turno destas eleições, fez questão de ir às urnas escolher seus candidatos e, para isso, viajou do Piauí ao município de Coelho Neto, no interior do Maranhão, onde fica sua zona eleitoral. João se mudou para a capital piauiense para cuidar da saúde que, mesmo sendo frágil, não o impede de se posicionar politicamente por meio do voto. No dia 30, garante: já tem o voto definido. E não corrobora com aqueles que se eximem do dever cidadão: “Quem perde são eles”.

A compreensão da importância das eleições também alcança eleitores mais jovens – inclusive aqueles que não atingiram a maioridade. É o caso de Luís Romero, que votou pela primeira vez este ano. Aos 17 anos, ele já entende o valor do voto e se percebe apto a somar ao eleitorado brasileiro. “Quero exercer meu papel na sociedade, ajudando a escolher uma pessoa que acredito ser apropriada para administrar nosso país”, afirmou. No processo de se ver como eleitor, Luís relata que o incentivo da família e amigos foi essencial para desenvolver uma consciência política como cidadão.

 


Na 3ª série do Ensino Médio, Luís percebe que a maioria dos colegas de turma decidiu votar no primeiro turno e quer também is às urnas no segundo. Para participarem ativamente das eleições, após conversas entre os colegas e familiares, os estudantes decidiram obter o Título de Eleitor ainda no primeiro semestre do ano. “Acredito ser não menos do que nosso dever como cidadãos e cidadãs”. explica Luís.

Na caminhada rumo ao segundo turno, Maria Luisa, 17 anos, se junta à maior parcela (52%) do eleitorado, formada por mulheres. Assim como Luís, ela sentiu a obrigação de ir às urnas na tentativa de mudar o futuro do país. A jovem eleitora relata à reportagem que, após passar a acompanhar a política brasileira,  nunca se sentiu representada e, por isso, decidiu votar, realizando um desejo antigo. “Sempre tive certeza de que votaria antes dos 18 anos”, contou. 

Maria Luisa assume uma postura de insatisfação quanto à abstenção. “Votar nulo, branco ou até mesmo se abster disso é abrir mão do seu direito de ser ouvido”, destaca. Ela aguarda ansiosa o dia 30 de outubro para somar à escolha do novo presidente do Brasil. “Votar é um direito que eu exerço com um sorriso no rosto”, declarou.

 


De acordo com a Constituição, votos nulos e brancos não são contados como válidos. A
Lei nº 4.737 do Código Eleitoral diz, em seu Art. 211, que deve ser “eleito presidente da República o candidato […] que tiver obtido maioria absoluta de votos, excluídos, para a apuração desta, os em branco e os nulos”. A mesma regra se estende à escolha de governadores (artigos 28 e 32) e prefeitos (artigo 29). 

Em termos gerais, a abstenção não traria grandes consequências no resultado final do pleito. No entanto, a situação muda em disputas acirradas, quando o número de não votantes interfere diretamente no resultado. “Numa eleição apertada como essa, 1% de votos a menos pode definir o resultado final”, explica André Gonçalves. “A depender de seu percentual, a abstenção afetará um ou outro candidato”, alertou. Nas últimas pesquisas eleitorais divulgadas, Lula (PT) e Bolsonaro (PL) apresentam diferença de apenas 4% nas intenções de voto.

Leia mais: Na mão dos indecisos

Abrir mão do direito de escolher seus representantes pode ser consequência de inúmeros fatores. Ao contrário de João, que encarou uma viagem para ir às urnas, muitas pessoas enfrentam dificuldades de deslocamento. “Vejo que muita gente deixa de votar porque não consegue ir até o local de votação no dia”, observa o eleitor. André Gonçalves corrobora com a observação e chama atenção para que soluções sejam criadas, de modo que os grupos sociais menos favorecidos participem do processo eleitoral. “O próprio estado deve se mobilizar para oferecer condições mínimas de transporte e de acesso às seções eleitorais”, destacou.

Para convencer os eleitores, as estratégias mais adotadas pelas camapanhas são empregadas no campo das emoções, na busca de atingir camadas do eleitorado que poucas vezes são acessadas, de acordo com o cientista político. “A mobilização dos afetos – como o ódio, o medo, a esperança, a alegria – pode levar pessoas, que não necessariamente votariam em outra situação, a irem às urnas”, pontua.

Desde 1º de outubro o eleitorado tem sofrido assédio eleitoral e até “espiritual”, praticado por meio de desinformações, abuso de poder econômico e mentiras, de modo a serem convencidos a votar. Logo nas primeiras semanas após o primeiro turno, o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) passou a receber mais de 500 alertas de fake news relacionados à eleição. Os dados apontam um crescimento alarmante em comparação à primeira fase da campanha.

Até o dia 30, os candidatos lutam por mais votos para garantir uma vantagem nas urnas, ao passo que eleitores tentam driblar estratégias desonestas das quais podem ser alvo. Saber comunicar-se de maneira eficaz com a parcela de eleitores indecisos pode ser a chave rumo a uma queda na abstenção. “Podemos conversar com as pessoas do nosso entorno sobre a situação do país e as possibilidades de resgate democrático”, recomenda André. “As transformações só virão, mesmo que de forma um tanto frágil, a partir das eleições e do voto popular”.

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1 comentário

Sinara · 25 de outubro de 2022 às 17:14

Que matéria excelente!

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