sábado, 23 de novembro de 2024

As mulheres e o babaçu

Quebradeiras de coco falam sobre valorização do produto e desvalorização do trabalho

10 de agosto de 2021

Edição Luana Sena

São cinco horas da manhã quando Francisca Nascimento e outras mulheres na região de São João do Piauí, a 460 km da capital, se levantam para preparar o café da manhã. Elas alimentam os filhos e arrumam a casa antes de ir para o local de trabalho, ao qual se referem como “mato”. São as áreas com babaçuais. 

Francisca é apenas uma das 50 mil mulheres, distribuídas em 10 municípios do Piauí que trabalham como quebradeiras de coco. Uma atividade intensa, embaixo de muito sol, que costuma acontecer durante os meses de março a agosto. O trabalho é feito por muitas mãos, despertando a união de grupos de mulheres, trabalhadoras rurais. Elas criam a própria rede de apoio e mantêm a tradição, ao passo que preservam o meio ambiente e lutam por políticas públicas para a valorização de seus trabalhos.

(Arte: Aline Santiago)

A união nas unidades de coleta de babaçu foi um mecanismo utilizado para conseguir maiores lucros na venda dos produtos derivados do babaçu. As mulheres se reúnem para ministrar cursos e oficinas sobre a atividade. Apesar disso, acreditam que o incremento de incentivos do poder público poderia melhorar a qualidade de vida desses grupos. 

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Francisca, integrante do Movimento Interestadual das Quebradeiras de Cocos, conta que a maior dificuldade está no baixo valor que o material coletado é vendido. “Pode variar entre um ou dois dias todo o processo de extração e limpeza para gerar um litro de azeite”, explica. Os produtos fabricados pelas mulheres – da coleta a embalagem – são repassados para o Governo do Estado através do Programa de Aquisição de Alimentos (PAA) que, entre 2018 e 2020, distribuiu cerca de 20 toneladas de alimentos para famílias em situação de vulnerabilidade. 

A extrativista acrescenta que as quebradeiras de coco precisam de apoio do estado em relação a aquisição dos alimentos e valorização dos produtos. “O recurso é pequeno para tantas famílias”, argumenta.

Para complementar a renda, principalmente nos períodos entressafras, as mulheres quebradeiras de coco procuram outras fontes de renda como a agricultura e criação de animais. “É dessa forma que conseguimos sobreviver”, finaliza Francisca.

 

Do outro lado do estado, a 462 km de Francisca, mora Maria Cleudimar Moreira. Na cidade de União, ela também garante o sustento da família com a venda de derivados dos babaçuais. Com o conhecimento adquirido com a experiência de seus familiares, ao longo dos anos trabalhando como quebradeira de coco, ela observa as potencialidades do fruto. “Há a possibilidade do uso do mesocarpo (fragmento do coco babaçu) tanto na alimentação como na cura de doenças”, aponta.

O babaçu é coletado entre as regiões de transição Amazônia, Cerrado e Caatinga no estado do Maranhão, Tocantins, Piauí e Pará. O mesocarpo é uma das partes do fruto usado tanto na suplementação da alimentação – empregado até mesmo na alimentação escolar através de sorvete, bolos e massas – como para tratamentos fitoterápicos.

As propriedades medicinais da planta, comprovadas através de estudos científicos, são: antiinflamatória, imunomoduladora, analgésica e antipirética. Para explorar cada potencial, no entanto, é necessário sobretudo respeitar o período de extração e manejo da palmeira.

A preservação é um dos pilares do extrativismo das mulheres quebradeiras de coco. Maria Cleudimar aprendeu com a família e amigos a importância da preservação ambiental para a manutenção da renda “Aproveitamos tudo e fazemos a retirada com cuidado e no tempo correto”.

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Categorias: Reportagem

Camila Santos

Graduanda em jornalismo na Universidade Federal do Piauí.

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