O retorno das aulas presenciais em toda rede estadual de ensino do Piauí estava marcado para o dia 7 de março de 2022. Entretanto, há 22 dias os professores se encontravam em greve, impedindo que a volta às salas de aula acontecesse. De março para cá, já são quase três meses do movimento grevista – de um lado, professores afirmam não receber o piso salarial previsto em lei; de outro, o governo do estado garante que o pagamento do piso é efetuado.
Em assembleia realizada no dia 23 de fevereiro, os trabalhadores da rede estadual de educação do Piauí decidiram entrar em greve geral por tempo indeterminado. Eles cobravam os pagamentos dos reajustes salariais de 2019 (4,17%), 2020 (12,84%) e 2022 (33,24%). Em março deste ano, a ALEPI – Assembleia Legislativa do Piauí – aprovou o reajuste de 14,17% para os professores da rede estadual. Com a aprovação, desde de abril o novo piso salarial dos profissionais do magistério, que trabalham 40 horas semanais, é de R$ 3.845,66.
Em janeiro de 2022 o Piso Salarial Nacional – valor mínimo que deve ser pago aos professores do magistério público da educação básica, em início de carreira, para a jornada de, no máximo, 40 horas semanais – teve um reajuste 33,24%. Cada professor deverá receber, como base, R$ 3.845,63.
Piso salarial
Mesmo com o reajuste aprovado em março deste ano, a greve continua. Para a categoria, o estado realizou uma espécie de “maquiagem” que contribui para a desvalorização do professor. Ao oestadodopiaui.com, Fábio Matos, secretário de Assuntos Municipais do Sinte – PI explicou o motivo da categoria ainda permanecer em greve mesmo com o reajuste salarial aprovado na Assembleia Legislativa.
Das seis classes de professores existentes (A,B,SL,SE,SM,SD), somente profissionais em início de carreira (A e B) teriam sido beneficiados com o reajuste – passando a ganhar R$ 3.845,66. As classes SL, SE, SM e SD não tiveram os devidos reajustes, apenas a incorporação do auxílio alimentação. “O governo tenta maquiar a Lei do piso e ainda desvaloriza os profissionais que fazem especialização, mestrado e doutorado em busca de melhoria na qualificação profissional”, diz Fábio.
O secretário afirma ainda que, há cerca de três anos, a categoria está sem receber o reajuste salarial previsto em lei sancionada em 2006 para a justa valorização da carreira. “A administração pública achatou a carreira do magistério”, comenta. “O auxílio alimentação, a regência – gratificação dada aos professores que estão em sala de aula – não podem ser incorporados ao salário determinando o aumento salarial”, alega. “É inconstitucional”.
Procurados pela reportagem, a Seduc e o Governo do Estado informaram que todas as informações relacionadas aos pagamentos de professores estão disponíveis no site da secretaria. Uma nota disponibilizada no endereço eletrônico da Seduc, afirma que o governo vem, ao longo dos anos, cumprindo a política do Piso Nacional do Magistério. “Em 2022, o pagamento do piso já está garantido e o menor salário pago a um professor da rede estadual atualmente é de 3.845,63 reais”, diz o texto.
O Maranhão, vizinho ao Piauí é o estado brasileiro que paga os melhores salários para professores. De acordo com a tabela atualizada, enviada pelo sindicato, os profissionais em início de carreira com licenciatura plena (SL) e jornada de 40 horas semanais, recebem atualmente R$ 6.483,65 – no Piauí, a mesma categoria recebe R$ 3.954,63, quase metade desse valor. Em 2022, o Maranhão implementou o auxílio alimentação, no valor líquido de R$ 300,00 para todos os professores da rede pública estadual que estão na ativa, incluindo os professores contratados e pessoal administrativo.
Em abril, o Tribunal de Justiça do Piauí decretou a ilegalidade da greve dos professores da rede pública estadual e determinou ao sindicato a suspensão imediata da paralisação que completava 63 dias. Em caso de desobediência da decisão, a multa diária estabelecida era de 10 mil reais. Mesmo com a decisão judicial, uma nova assembleia foi realizada e os professores decidiram pela continuidade da greve.
Leia mais: TJ decreta ilegalidade da greve dos professores da rede estadual de ensino
Enquanto o impasse entre governo e professores continua, Leandro Araújo, 17 anos, estudante de uma escola pública estadual, na zona Sul de Teresina, se diz desmotivado para concorrer ao Enem 2022. “Estou tendo apenas algumas disciplinas dos professores que não aderiram à greve”, comenta o estudante. “Mas isso não é o suficiente para concorrer com quem está tendo aula todos os dias”.
Em carta aberta aos estudantes do Piauí, os grevistas reafirmam o respeito e o compromisso com a educação e lamentam que o poder público tenha provocado a greve. “Assim que o governo dialogar com a categoria e cumprir sua obrigação conosco, as aulas serão repostas”, diz trecho da carta.
Para Leandro, a luta dos professores é válida. Ele cita também reivindicações como melhoria na estrutura da escola, na alimentação e no transporte escolar, mas reitera que o prejuízo no aprendizado dos alunos também deve ser levado em consideração. “É angustiante chegar no 3º ano, em um dos momentos mais importantes de sua vida, e você não ter suporte para conseguir entrar em um universidade”, lamenta.
Valorização do docente
Nos últimos anos, os debates sobre a educação têm tido a qualidade como um dos temas mais relevantes. Vários elementos têm sido elencados e debatidos como indispensáveis para uma oferta educacional com padrões mínimos de qualidade. Dentre eles, a valorização do magistério é sempre apontada por pesquisadores em educação, coisa que não acontece no Brasil.
Dados do último relatório global de status do professor apontam que, em uma escala de 0 a 100, onde quanto mais alto o número maior é o prestígio do professor, o Brasil fez dois pontos – o que o levou à última posição do ranking. “A falta de valorização do professor faz com que estudantes com bom desempenho optem por carreiras mais prestigiadas e com melhores salários”, aponta o relatório. “Gerando um ciclo vicioso de desmotivação dos profissionais, que também não recomendam a profissão aos mais jovens”, diz a análise.
O levantamento mostra ainda que 88% dos brasileiros consideram a profissão de professor uma profissão de “baixo status” – o segundo pior lugar do ranking mundial, perdendo apenas para Israel, onde 90% dos cidadãos pensam da mesma forma. Talvez por isso, apenas 1 em cada cinco brasileiros incentivariam o filho a ser professor – a sétima pior posição global.
Em um cenário educacional ideal, o professor é valorizado pela escola, pelo governo e pela sociedade devido à importância do seu papel na construção de um país melhor. Para isso, o estudo ressalta que o magistrado deve receber todo o suporte necessário para realizar seu trabalho, inclusive a utilização de tecnologia que facilite sua rotina dentro e fora de sala de aula.
2 comentários
Helena Monteiro · 9 de maio de 2022 às 19:57
Triste, porém motivada a continuar tanto em sala de aula como nas ruas, como ora o fazemos. Não me arrependo da profissão que escolhi, muito menos das duras batalhas que venho travando ao longo da carreira. Sou professora por convicção. É o que sei fazer, é o que gosto de fazer. Contudo, nossa luta ultrapassa qualquer reajuste ou até mesmo valorização é estrutura nas escolas. Ela é contra a corrupção que assola nossa sociedade, acentuando as desigualdades, aumentando a violência. Denunciar todos esses desmandos também é tarefa nossa, educadores conscientes de que,
se esse dinheiro do piso não for para nossos salários ( e que vem carimbado para isso) será derramado nas próximas eleições em compra de votos com a política do pão e circo!!! Isso sim é deplorável, é uma lástima!!!!!!!
Márcia Noelha Rodrigues Soares · 9 de maio de 2022 às 21:15
Sou professora do estado a 22 anos e desde que esse governador Wellington Dias entrou no governo ele achatou o salário dos professores e de todos funcionários públicos. O nosso piso salarial ele nunca respeitou, todas as nossas vantagens foram incorporadas no vencimento acabando com nosso salário. Está com mais de três anos que não recebemos aumento do piso salarial, causando assim perdas no nosso salário.