segunda-feira, 20 de maio de 2024

Nem trabalha, nem estuda

Quase 1/3 da população jovem brasileira está fora das salas de aula e do mercado de trabalho

06 de janeiro de 2022

Edição Luana Sena

O Estado do Piauí: Você pensa em entrar na universidade?
Felipi Carvalho: Talvez mais pra frente.
O Estado do Piauí: E trabalhar, já mandou currículo para algumas empresas?
Felipi Carvalho: Ainda não.
O Estado do Piauí: E pretende?
Felipi Carvalho: Também não. 

Felipi, de 17 anos, acabou de sair do Ensino Médio. Após concluir o último ano da vida escolar, entrou para a categoria de quase 1/3 da população conhecida como “nem nem” – nem trabalha, nem estuda. Ao todo, são mais de 12 milhões de jovens entre 15 e 19 anos que estão fora das salas de aula e do mercado de trabalho. 

Os dados obtidos pela consultoria IDados revelam uma previsão preocupante, tendo em vista que a força de trabalho está envelhecendo no Brasil. Até 2035, há uma expectativa de diminuição considerável das pessoas ativas no setor de serviços e, portanto, uma necessidade de empregar e qualificar a juventude atual. 

Ao passo do número expressivo de “nem nem”, há uma grande parte de jovens que continua desempregada – e não raros são prejudicados pelas mudanças nos padrões de mercado de trabalho. A falta de trabalho digno e estável é o que tem mantido muitos jovens sem possibilidade de desenvolver capacidades e talentos. 

Durante a pandemia, o problema se acentuou: um em cada quatro jovens gostaria de trabalhar, mas não está empregado e deixou de procurar emprego. A taxa de desemprego entre os jovens de 18 a 24 anos de idade, brasileiros, ficou em 27,1% no primeiro trimestre de 2020, segundo o IBGE – Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. 

 

 

A precariedade dos vínculos de trabalho expostas aos jovens é um dos principais desmotivadores. Em geral, é mais provável que os jovens sejam empregados em modelos de contratos temporários e com prazos determinados. A informalidade de trabalho já atinge cerca de 50% dos jovens, segundo a United Nations Population Fund (UNFPA). 

Desigualdades regionais, de escolaridade, raça e gênero afetam a renda dos jovens brasileiros. Grupos que são tradicionalmente excluídos (negros, indígenas, comunidades ribeirinhas), analfabetos e pessoas que moram na região Norte e Nordeste apresentaram reduções de renda pelo menos duas vezes maiores que a média geral, entre 2014 e 2019. 

Para as mulheres, um cenário de uma em cada quatro jovens no Brasil revela uma ausência do gênero feminino em vagas de emprego e nas escolas, mas também em treinamentos ou formações. Embora para algumas mulheres isso possa representar uma escolha, como frisou o IBGE, a falta de acesso a um ensino de alta qualidade durante a infância, a escassez de escolaridade em tempo integral e as barreiras ao emprego para as mulheres no mercado de trabalho são fatores que ajudam a explicar a sub-representatividade desses jovens no mercado.

Uma solução bala de prata

A inserção de jovens no mercado de trabalho não chegará a jato, ou em uma bala de prata, como explica Daniela Saraiva,  coordenadora do GOYN – Instituição de Desafios e Oportunidades para jovens no Brasil. Para trabalhar a inclusão produtiva de jovens, o problema deve ser encarado de forma sistêmica e colaborativa – é o que diz analisando soluções possíveis no Atlas da Juventude, publicado em 2021.

A inclusão produtiva, de acordo com a coordenadora do GOYN, diz respeito à geração de trabalho e renda de maneira estável e decente para as populações – com enfoque em situação de pobreza ou vulnerabilidade. Com o aumento da digitalização da economia, muitas funções realizadas pelos jovens foram eliminadas e as possibilidades de contar com o acompanhamento de alguém no ambiente de trabalho foram reduzidas. Esse panorama vai de encontro com a situação de jovens sem experiência que passaram ainda a competir com pessoas mais velhas dispostas a assumir postos menos qualificados.

Com a pandemia, Daniela explica que muitas dessas iniciativas e projetos ganharam um contorno digital que levou a um aumento de amplitude e atendimento. Porém a lacuna digital pode prejudicar e deixar para trás ainda mais os jovens que não têm acesso à internet. “O ideal é buscar tipos de treinamentos das necessidades das empresas, levar cursos e desenvolver empreendimentos nos territórios e construir políticas de diversidade que incluam os jovens”, analisa Daniela. 

No atual contexto de pobreza em que jovens precisam gerar renda em um curto prazo, é necessário que essas estratégias permitam uma rápida inserção dessa população no mundo do trabalho. “Como diriam expoentes da música brasileira: não temos tempo a perder porque é tudo pra ontem”, pontua Daniela. 

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Categorias: Reportagem

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