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No revés do mais do mesmo

De Miguel Alves, Mc Bolsa Família, Mc Vale Gás e o Dançarino conquistaram as redes sociais com músicas que trazem as mazelas do povo com humor

18 de agosto de 2023

Caminhando ao revés dos novos artistas com hits de internet com data de validade para jovens “cansados” que quase sempre fazem referência a sentar, geralmente explicitando um teor sexual, três piauienses apostaram em uma fórmula antiga misturando rap, humor e muita criatividade para ganhar as redes sociais. Atualmente com quase 500 mil seguidores no Instagram, com vídeos assistidos mais de 200 milhões de vezes, eles trazem letras que exaltam a realidade visceral de milhões de brasileiros, que vão da briga em família por um pedaço de carne a sátiras sobre a beleza de alguém que não consegue uma namorada. O trio Mc Bolsa Família, Mc Vale Gás e o Dançarino, saiu de Miguel Alves, a 112 km de Teresina, rumo à São Paulo para impulsionar a carreira e foi um dos destaques do programa da Eliana, no SBT, no último dia 13 de agosto.

Captura de tela de um dos vídeos do trio nas redes sociais. Foto: Reprodução/YouTube

O trio iniciou a carreira como a maioria dos famosos na internet: com vídeos despretensiosos que atiçaram o talento para alguma coisa. No caso deles, pegaram carona no sucesso dos vídeos curtos e da onda do trap/rap, mas com uma dose gigante de criatividade e vivência para a elaboração das letras das músicas, que tratam com humor e leveza de temas profundos vivenciados por eles.

Em uma das letras, por exemplo, traz a realidade de 33 milhões de famílias que hoje integram o triste quadro de insegurança alimentar no Brasil. Nos versos, no almoço de uma família grande, uma pessoa briga com a mãe pelo fato de ter ganhado menos comida que os irmãos, recebendo só o pé da galinha. No final, o filho mais velho reclama que só botaram maxixe no seu prato e corre pro mato. A mãe, finaliza: “a carne é regrada,  por isso que não deu de meu filho ganhar nada, por isso que não deu de meu filho ganha nada. A carne é regrada”, diz a composição.

O grupo tem dezenas de vídeos nas redes sociais e as músicas contam com a mesma melodia de fundo, uma mistura de reggae e hip-hop, que eles acentuam ao iniciar os vídeos com a frase “hip-hop reggae, Mc Bolsa Família e Vale Gás, e seu Dançarino”.

A chamada inicial para as músicas poderia passar despercebida, mas traz muito do que o grupo tem, que é a união, que inclusive os mantém forte hoje na aventura pelo sucesso em São Paulo. Devido o alcance dos vídeos, eles foram contratados pela produtora LoveFunk, que agencia muitos dos grandes nomes que produzem hits na internet.

O Dançarino, que sempre aparece ao fundo nos vídeos, poderia ser apenas um personagem qualquer nessa história, um simples figurante, mas além da dança às vezes desengonçada, ele tem um papel fundamental e segue firme até hoje. José Luiz, o Dançarino, conta que o projeto não iniciou com a música, mas com vídeos de humor, que gravava com Cláudio Santos, o hoje Mc Bolsa Família, na cidade de Miguel Alves. “Há exatamente dois anos um tio nosso colocou internet lá no nosso interior. Nós começamos frequentar e pagávamos R$ 10 reais para usar. Começamos ver os vídeos lá no Kawaii, quando tive a ideia de começarmos a gravar vídeo de comédia e contar nosso cotidiano. Tudo que nós íamos fazer a gente gravava e jogava no Kawaii”, destaca.

Com a vida dura e as cobranças de toda família do interior, Dançarino teve que partir em busca de trabalho em São Paulo, mas longe da produção dos vídeos, sendo mais um na multidão da selva cinza da capital paulista que trabalha numa firma. “Ele viajou e eu fiquei sozinho fazendo vídeo, meio desanimado. Aí veio a doença também. Fiquei doente um tempo aí e fiquei mais desanimado ainda. Parei de fazer vídeo. Aí o Dançarino voltou, nós começamos a fazer vídeo de novo. Aí apareceu o Mc Vale Gás”, destaca.

Segundo Cláudio, a entrada do Mc Vale Gás, José Ricardo, deu um estímulo para o grupo, pois as suas rimas eram repletas de muita criatividade, um dos grandes diferenciais do trio. “Ele escrevia as rimas e mandava eu gravar o vídeo, até que um dia eu falei: ‘Vale Gás, tu tem que fazer vídeo, tu tem que rimar’, aí ele fez um vídeo comigo, coloquei no Kawaii, deu quase um milhão de visualizações. Aí eu falei: ‘agora a partir de agora tu vai fazer vídeo comigo, aí toda rima que gravava e postava em todas as redes sociais, até que um dia nós gravamos uma, estourou no Insta, aí a Love Funk entrou em contato querendo trazer nós para São Paulo. Hoje estamos aqui”, comemora.

A estadia em São Paulo vem rendendo muito trabalho para o trio, que já foi convidado para participar de vários programas de rádio e TV. O último foi no programa da Eliana, no SBT, exibido no dia 13 de agosto. Além disso, o grupo está divulgando um clipe produzido pela LoveFunk.

Mais do que a história de mais um grupo de música piauiense que tenta sucesso nacional, o trio traz, tanto nos seus vídeos, como nas suas falas os traços de uma amizade muito forte, como afirma o Mc Vale Gás: “Desde que o primeiro vídeo estourou, desse dia para cá, a gente tá sempre junto”, finaliza.

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Diego Iglesias

Jornalista, mestre em comunicação pela Universidade Federal do Piauí.

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