Por Olívia Perez e Bruno Souza*
Tem sido comum a percepção de que os jovens não se interessam pela política. Essa percepção esteve presente na campanha do Tribunal Superior Eleitoral para estimular a participação das juventudes nas eleições no início do ano de 2022. A presente reflexão defende que os jovens se interessam pela política, ainda que haja um descontentamento geral com a política institucional.
Um primeiro ponto a se ponderar é que a situação de afastamento e desalento acerca da política no país não é uma especificidade da parcela jovem da população. Conforme dados do Latinobarômetro (2020), as instituições políticas do Brasil se encontram em xeque: há uma desconfiança, especialmente em relação aos partidos políticos, tanto na faixa de idade entre 16 e 29 anos quanto entre aqueles que têm 30 anos ou mais.
Indo mais além, a desconfiança é em relação ao próprio regime democrático. Ainda conforme dados do Latinobarômetro (2020), há um forte sentimento de insatisfação em relação ao real funcionamento da democracia no Brasil, novamente entre todas as faixas etárias. Mas isso não é só uma percepção, considerando as profundas desigualdades sociais do país.
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Ainda assim, tal desconfiança não significa que os jovens estão apáticos ou não estão participando politicamente, como pode parecer em um primeiro momento. Uma das comprovações do interesse por política entre os jovens é a particpação deles em grandes protestos. Apenas para citar os últimos anos, os jovens foram para as ruas no intenso ciclo de protestos iniciado com as Jornadas de Junho de 2013. Mais recentemente, nem a pandemia foi capaz de impedir ou alterar substantivamente o ciclo de protestos que estava acontecendo no Brasil.
Os protestos contaram com forte presença de organizações de juventude chamadas de coletivos que atuam na defesa dos direitos de grupos com menos acesso a eles como mulheres, negros, moradores de periferia e população LGBTQIA+ (sigla para lésbicas, gays, bissexuais, transexuais, travestis, transgêneros, queer, intersexuais, assexuais e o mais, que serve para abranger a pluralidade de orientações sexuais e variações de gênero). Os coletivos por vezes se definem como horizontais e autônomos – o que proporcionaria uma maior inclusão – contrapondo-se assim às instituições nas quais eles pouco acreditam, em especial os partidos políticos (Perez e Souza, 2020).
Fica então o convite para que as análises sobre as juventudes não acentuem apenas o baixo comparecimento eleitoral, mas atentem para os importantes recados que suas mobilizações têm expressado. Há uma percepção entre os jovens de que as instituições políticas não estão conseguindo incluir as juventudes no campo dos direitos, assim como outros grupos com mais dificuldade de acesso a eles. E para que isso aconteça é necessário que as organizações políticas se abram de fato à participação desses grupos. Somente com a inclusão de todxs (jovens, mulheres, negros, moradores de periferia e população LGBTQIA+) nas principais decisões públicas, eles adentrarão no campo dos direitos.
*Olívia Perez é doutora em Ciência Política e mestre em Sociologia pela Universidade de São Paulo (USP). É vice-coordenadora do programa de Pós-Graduação em Ciência Politica da UFPI e representante do Piauí junto à SBPC. (oliviaperez@ufpi.edu.br)
Bruno Souza é doutor e mestre em Ciência Política pelo Programa de Pós-Graduação em Ciência Política da Universidade Federal do Rio Grande do Sul. É professor do departamento de Ciências Sociais e do Programa de Pós-Graduação em Sociedade e Cultura da UESPI, e do Programa de Pós-Graduação em Ciência Política da UFPI.
Referências:
LATINOBARÔMETRO. Banco de dados: Latinobarómetro, 2020. Disponível em: <http://www.latinobarometro.org> Acesso em 10 de abril de 2020.
PEREZ, O. C.; SOUZA, B. M. Coletivos universitários e o discurso de afastamento da política parlamentar. Educação e Pesquisa, v. 1, p. 1-19, 2020.
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